O nó górdio
A situação financeira europeia é muito preocupante. O silêncio mais ou menos ensurdecedor em torno desta questão não deixa de ser perturbante. Ontem o Banco Central Europeu (BCE) lançou uma medida histórica ao baixar a taxa de juro para os 0%. O efeito que se pretende com isso é o de estimular a economia e fazer aumentar o crescimento económico. Assim, em teoria, os bancos vão buscar dinheiro ao BCE sem juros para o emprestar às empresas e às famílias com o mínimo de encargos possível. Só que, como sabemos, a banca irá utilizar esta facilidade para repor alguns dos seus equilíbrios e às empresas e famílias o custo do dinheiro não baixará tanto assim. Seja como for, o estratagema será o de dinamizar as economias mais débeis da União Europeia (UE), como a nossa, incentivando ao investimento e ao aumento da procura para fazer crescer a economia. Mas aqui é evidente alguma contradição com a própria UE. Porque se por um lado se pretende fazer crescer as economias pelo lado do investimento e da procura - como o atual governo português está a tentar fazer - por outro vem a Comissão Europeia (CE) dizer que são precisas mais medidas de austeridade e que não se deve induzir as famílias ao consumo. Estamos perante um verdadeiro nó górdio das instituições europeias, que mostram à evidência as confusões, desorientações e até algum chauvinismo mal disfarçado de alguns países. Esta receita que afinal é já conhecida dos economistas - ao fim e ao cabo é uma variante do modelo keynesiano que tanto tenho defendido aqui - parece ainda incomodar alguns países (liderados pela Alemanha) que estão com receio de caso as economias mais frágeis - como a portuguesa, espanhola, italiana, francesa e até irlandesa -, regridam e os bancos alemães tenham que ser chamados a jogo. Esta visão interesseira e paroquial da Alemanha acomodada pela de outros países pode vir a ser fatal a curto prazo. O crescimento da zona euro é, e continuará a ser, muito débil. Se a isso somarmos os problemas de cariz social amplamente potenciados pela crise dos refugiados, poderemos vir a estar no centro duma tempestade perfeita. O aumento da compra de dívida externa aos países mais endividados por parte do BCE pode ser uma boa saída, mas também indicia que as economias da UE estão com enormes dificuldades. (A atenção felina dos mercados sempre apostados na especulação é clara). Mas também dá um sinal ainda mais preocupante, mostrando que poderemos estar a caminho duma recessão que conduzirá inevitavelmente a uma deflação, e aí chegados tudo é possível. Até o desmembrar do projeto europeu pode estar - e estará certamente - sobre a mesa. Estamos todos europeus no olho do furação e quando este se abater - se for esse o caso - ninguém estará a salvo. Depois haverá muitas justificações e recuos, mas será definitivamente demasiado tarde.
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