O paradoxo da incerteza
Aí está uma semana decisiva para a União Europeia (UE), logo para Portugal também. É a semana que pode dar o sim ao 'Brexit' - a saída da Grã-Bretanha da UE - num processo de que apenas se advinham contornos, porque certezas não as há. E também o período em que se perfilam as eleições na Espanha com o cortejo de incertezas que implica. Sobre o 'Brexit' é o primeiro caso da saída dum país da UE, caso seja essa a decisão. (Embora todos saibamos que a Grã-Bretanha nunca foi um parceiro comprometido, tendo sempre um pé dentre e outro fora). A saída implicará tempos difíceis para os britânicos, (embora minorados por não pertencerem à zona euro), mas para a UE também o serão. Poderá ser o princípio do fim, se vier a acontecer um efeito dominó, como muitos pretendem fazer crer. Países com forte exposição ao Reino Unido - caso da Holanda, Bélgica e Itália - poderão ser, e serão seguramente, aqueles que primeiro vão sentir o impacto. Depois, e como normalmente acontece, os países mais periféricos, com economias mais débeis, caso de Portugal, Espanha, Grécia, não deixarão se sentir as réplicas que este terramoto político certamente irá causar. E chegados aqui, será bom que nos questionemos sobre o porquê de tudo isto. Desde logo pela ligeireza da direita conservadora britânica que, para se perpetuar no poder, acabou por prometer um referendo à permanência da Inglaterra na UE, pensando que facilmente controlaria a situação. E, como vemos, não está a ser capaz, e caso o 'Brexit' vença, o governo cairá com certeza. Depois, convém saber porque é que os britânicos não querem continuar. E aqui é fácil de ver, porque é um sentimento que varre outros países, a que Portugal não fica alheio. A hegemonia ronceira e bafienta duma Alemanha que quer ser líder europeia. A mesma ambição que noutros tempos mergulhou esta mesma Europa na escuridão. E nós somos um bom exemplo disso mesmo. Quando vemos uma UE a discutir décimas sobre o défice - que resultou da aplicação das políticas que nos foram impostas - e se deixa de lado, questões como as dos refugiados que povoam o fundo do Mediterrâneo numa das maiores catástrofes humanitárias deste século; quando vemos uma UE que deveria ser solidária, amiga e cooperante, deixar que se ergam muros um pouco por todo o lado, quando na sua génese o seu derrube era a bandeira; a mesma Europa que com atitudes destas, acaba por pôr em causa as democracias, e por outro lado, permite e apoia regimes fascizantes como o são na Polónia, Hungria e Estónia; é altura de nos interrogar-mos afinal que Europa somos? Quando o presidente da Comissão - Jean-Claude Juncker - acha que as sanções não se aplicam aos grandes países porque são grandes e têm um tratamento especial; quando vemos o presidente do Eurogrupo - Jeroen Dijsselbloem - tratar com alguma sobranceria, para não dizer paternalismo, casos como a situação em Portugal, ele que até é um socialista (?); quando essa mão pesada vem dum organismo que nem sequer foi eleito; tudo isto é um caldo que só pode trazer a desunião entre os estados membros. Quando se acha que a experiência portuguesa não pode dar bons frutos para evitar efeitos de contágio, - que podem acontecer em breve em Espanha -, já pouco há a dizer. Quando ventos, que podem ser de mudança, sopram fortes no país vizinho, e que até motivam o distender a mão pesada, que será seguramente aplicada caso a esquerda vença, são bem exemplo do cancro ultraliberal - com apoio dos socialistas - está a minar a Europa. Longe vão os tempos da Europa solidária, sonhada por Jean Monet, desenhada por Robert Schuman e consolidada por Jacques Delours, tendo sido tomada por um grupo de burocratas que fazem de Bruxelas o seu quartel geral e decidem o destino dos povos desde os seus gabinetes alcatifados sem sequer conhecerem a realidade. (Veja-se a punição pública, que se pretendeu exemplar, sobre a Grécia, humilhando um povo que deu a democracia ao mundo, apenas para servir de exemplo). A UE foi um sonho de paz para a Europa e o seu fim poderá significar o regresso de alguns nacionalismos que afogarão o espaço europeu, de novo, no obscurantismo. Esses nacionalismos estão bem visíveis, e são tolerados dentro na UE, num dos maiores arremedos dos últimos tempos às democracias. Esses excessos estão bem patentes naquilo que se passou a semana passada na Grã-Bretanha. Em nome do 'Brexit' se matou e morreu numa atitude impensável e bem longe dos padrões europeus, da Europa evoluída, culta e civilizada. Jo Cox pagou o preço da intolerância, do radicalismo que inunda esta Europa sem que, aparentemente, ninguém faça nada para o evitar. Se a direita ultraliberal anda por aí a inquinar a União, é verdade que, também os socialistas têm dado a sua benção, não percebendo que se a UE se desintegrar, eles serão as primeiras vítimas. Não sei se este é o requiem anunciado para a Europa, mas aconteça o que acontecer com o refendo inglês, nada ficará como dantes neste paradoxo da incerteza para que a Europa foi atirada..
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