Os perigos da ingovernabilidade
Como vem sendo hábito há já um par de anos, e por questões profissionais, analiso o Orçamento de Estado (OE) com algum detalhe, tarefa que estou neste momento a desenvolver. Este OE não deixa de cumprir os mesmo princípios de tantos outros, com medidas mais populares, outras nem tanto; com coisas positivas e outras bastante mais controversas; e até, com algumas medidas que lá estão simplesmente para serem negociadas com os restantes partidos quando o governo não tem a maioria. Tudo isto é transversal a todos os OE, - seja qual for o partido no poder -, e este não é exceção. Embora este tenha algumas medidas interessantes do ponto de vista social, tentando captar os votos à esquerda, há outras que, por mais populares que possam ser não são simplesmente comportáveis. (A classe média ainda não está muito apoiada neste OE, mas fica a promessa que será no próximo ano. Vamos esperar para ver). Aquela que tem sido uma bandeira na discussão deste OE é o IVA da eletricidade. Todos achamos que o valor é excessivo, todos gostaríamos de pagar menos. Mas interessa saber é se as contas do nosso país comportam ou não a medida. Ontem, o PSD cavalgou a onda mais populista coisa que já nos vamos habituando nos últimos tempos. (Afinal Rio tem que marcar pontos junto dum eleitorado que o marginalizou, mas também tem que marcar pontos junto duma oposição interna que está longe de lhe dar tréguas). Contudo, a atitude de Rui Rio surpreendeu-me. Conheço Rio desde os bancos da faculdade, onde fomos colegas de curso e de ano, e sei que ele é duma honestidade acima de qualquer suspeita. Daí ainda mais a minha surpresa. Todos gostaríamos de pagar menos impostos na conta de eletricidade, mas a situação económica das contas nacionais não o permitem para já. E Rio sabe-o bem. Então desenhou-se um cenário de possível ingovernabilidade o que acarretaria um elevado custo para o país. A economia mundial está a dar sinais de abrandamento - basta ver as notícias que nos entram todos os dias pela porta adentro - onde até a poderosa Alemanha escapou à receção por uma unha negra. (Ainda hoje tenho dúvidas se foi de facto assim ou se alguma cosmética existiu para não dar um sinal negativo ao motor da Europa). Perante um cenário destes a ingovernabilidade seria o pior dos mundos para Portugal. O nosso país tem uma economia muito aberta e dependente do exterior, onde qualquer variação negativa exógena, nos causaria problemas bem difíceis, talvez até piores do que aqueles por que passamos na recente crise. Não sou um fanático do déficit, - embora ache que ter superavit é importante para dar maior credibilidade do país no exterior, e aqui estou em desacordo com Manuela Ferreira Leite -, mas também porque temos um dívida externa excessiva face ao PIB nacional que, embora tendo vindo a ser fortemente abatida, ainda é de um valor considerável. Isso só por si, leva a que as instituições internacionais estejam sempre atentas ao que por cá se passa e à consistência da evolução económica e financeira. Apesar disto, só comecei a ficar mais sossegado quando vi o otimisto de Costa em Bruxelas. Percebi que estavam a decorrer negociações nos bastidores e estas estariam a correr bem. Mais noite dentro, soubesse que o PCP se iria abster e, por conseguinte, anular esta medida. Cumpre aqui dizer que o PCP mostrou uma enorme responsabilidade face à situação, colocando o interesse do país acima dos seus, o que é louvável, depois do castigo que teve nas últimas eleições fruto do apoio que deu ao governo na última legislatura. Perante a irresponsabilidade do BE e o populismo barato do PSD, o PCP teve uma atitude louvável dum verdadeiro sentido de Estado. (E quando Rio vem falar na poupança dos gabinetes ministriais ainda é pior. Porque nunca se conseguiria anular o valor do IVA coisa que qualquer jovem economista sabe sem que para isso tenha que fazer grande contas). O importante é que se tenha afastado o cenário de ingovernabiliadade que já estava a ser olhado de soslaio pelo exterior. E, por agora, parece que tal aconteceu. Esperemos é que de futuro haja mais responsabilidade e menos oportunismo. Não se pode captar votos desta maneira tão básica pondo em causa o todo nacional. E o eleitorado também tem que o compreender.
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