Carta à minha afilhada Inês
Olá, Inês.
Não é normal dirigir-me a ti sob a forma epistolar, mas neste momento achei mais adequado. Tenho pensado em escrever-te algo para memória futura. Até então não o tinha feito. A tua vinda a minha casa com mais regularidade dado o período de férias fez-me pensar e decidir em escrever-te agora. Fiquei muito contente pela tua passagem para o 8º ano, mas essa alegria foi toldada por outras coisas de que tenho que te falar. Este ano que ainda vai a meio tem sido um ano muito aziago no que a ti diz respeito. A razão é tudo menos prosaica, foi o ano em que foste muito prejudicada sem que para tal tivesses contribuído, mas como é suez dizer-se, a corrente quebra sempre pelo elo mais fraco. E tu és o elo mais fraco. Eu não pude ficar indiferente a coisas que se passaram num passado recente, - e que são do teu conhecimento - onde o insulto rasteiro é norma. Onde a afronta embrulhada pela mais vil perfídia se afirmou. Quem vem a minha casa, - seja qual for a condição em que nela está -, não pode ser destratado por terceiros porque tal configura uma falta de respeito, - e talvez mais do que isso -, para comigo. Talvez aches isso incompreensível, até arcaico, mas fui educado assim. Fui educado num tempo em que a Educação se escrevia com letra maiúscula, bem longe dos tempos atuais, onde se escreve com letra bem minúscula e por vezes com erros. Coisas dos tempos modernos. Contudo aceito quem não teve acesso a essa tal Educação, mas não posso aceitar que as pessoas não se esforcem por serem melhores. Sou homem para perdoar, mas não me peçam para esquecer. Mas sei que sou homem para nunca dar uma segunda oportunidade a ninguém. A ninguém, repito! Agora não posso ir mais além. Um dia eu te explicarei melhor tudo isto, e caso já cá não esteja para fazê-lo, tenho alguém mandatado para te esclarecer. Depois tirarás as tuas ilações e julgarás o teu padrinho. Vais ouvir falar muito mal dele, quero que analises por ti e depois faças um julgamento justo, seja lá ele qual for. E eu apenas e só terei que aceitar o teu veredito. Só assim ficarei descansado. A verdade tem sempre duas faces. É preciso focar-nos na situação livre de quaisquer juízo apriorístico. Neste momento, depois desta missiva já um pouco longa, sinto-me cada vez mais triste porque a alegria com que vens a nossa casa foi ofuscada por razões que te são alheias. Até o poderoso sol sucumbe perante as nuvens espessas da tempestade e foi o que se verificou. Mas apesar disso, eu estarei sempre aqui seja quais forem as circunstâncias. Mesmo com mar encapelado, de vagas alterosas, eu estarei sempre presente e não te deixarei cair. O amor ultrapassa tudo e o meu vai para além da eternidade. (Deves ter reparado que tenho escrito esta missiva sempre na primeira pessoa para me dirigir a ti. Apenas o faço por mera questão semântica. Neste assunto, a tua Mamie está solidária comigo e tudo o que foi decidido foi-o em conjunto depois de muito falado e ponderado). Ainda és muito jovem, mas acredita que a seguir à tempestade vem a bonança, a seguir às nuvens espessas vem o brilho do sol. Não fiques triste, não desanimes, continua os teus estudos com o mesmo fervor que ultimamente tenho observado, só assim irás longe. Na vida só evoluímos pelo nosso trabalho, pelo nosso esforço, pela nossa cultura, pela nossa instrução, pela nossa educação. Quem assim não faz não irá longe, pelo menos com a lisura que se espera das pessoas de bem. Nunca sairá da mediania. A Mamie e eu aqui estaremos sempre, como dois pilares ao teu lado, se assim quiseres. Tudo faremos para que o futuro se abra risonho perante os teus olhos. E estou certo que assim será. Só esperamos que o tempo... nos dê tempo!
Do teu padrinho que muito te ama.
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