Turma Formadores Certform 66

Wednesday, December 24, 2014

Feliz Natal! (Um esquisso de mensagem)

Porque venho repetidamente falando do Natal, talvez dê a sensação de que é uma época particularmente feliz para mim. Pois desenganem-se. Sempre gostei muito dos preparativos, mas à medida que a época se aproxima a ansiedade vai tomando conta de mim. Há razões para isso - há sempre uma razão seja para o que for - mas disso não quero falar agora. Esta atitude vai-me acompanhando desde muito jovem. Hoje, já com o peso de alguns anos em cima, ela continua, embora assumindo vertentes diferentes. Nesta fase da minha vida, o que mais me marca, é ser o dia das memórias, a época dos meus ausentes, daqueles que povoaram e enriqueceram esta minha existência. E por ironia do destino, este ano, (mais precisamente neste dia 24, véspera de Natal), faz quatro meses que a nossa querida Tuxa morreu. Mais uma efeméride, mais uma ausência que marca, que fere, que dói. Mais uma memória que queima. Por tudo isso, esta é sempre uma época que me trás angústia em vez de alegria. (Como todas aquelas datas em que se celebram efemérides porque é nessa altura que se reflete com mais intensidade a dor das ausências). Cada um cria o seu próprio inferno, e eu não fui exceção e criei o meu. Digamos que do tríptico natalício das oferendas dos Reis Magos, não consigo esquecer o ouro,  o incenso e a mirra. (Porque normalmente esquecemos aquele que nos dá menos jeito). Mas os três estão lá para nos lembrar o efémero da vida. Porque a época de Natal é também uma época de reflexão sobre a perenidade da vida, bem longe do consumismo em que nos fomos habituando a viver. O ouro é o símbolo do poder, da realeza, bem longe da prepotência egocêntrica que nos move; o incenso é o símbolo da sapiência e da espiritualidade, bem longe da mesa farta onde satisfazemos a gula até rebentar ou dos presentes aprimoradamente embalados; a mirra é o símbolo da morte, do fim prematuro e terrível que queremos esquecer, na bestialidade da comezaina, também ela símbolo da morte para muitos seres, a quem negamos o direito de viver a sua vida. Nestas alturas, nada disto importa. E quando digo que o Natal é também um símbolo de morte anunciada no começo da vida, sou quase exorcizado como ave agoirenta. Mas é assim mesmo no simbolismo cristão que queremos renegar, ofuscados pelas luzes, pelos presentes, pela mesa e até pela ignorância. Desenganem-se os que pensam que o Natal é uma árvore iluminada - tradição importada dos países nórdicos -; um presépio - na tradição mais do sul; do Pai Natal - pintado pelo marketing da Coca-Cola, bem longe da cor verde da tradição nórdica dos espíritos da floresta na boa tradição pagã, relegando para segundo plano o Menino Jesus da tradição cristã que é a nossa. Por tudo isto, o Natal assume um grande equívoco que pretendemos ignorar. Convivemos mal com a verdade que nos afasta das fantasias do nosso imaginário que nos é inculcado desde a infância. Mas não pensem que vejo esta época tão negra assim. Porque como é costume dizer, toda a medalha tem o seu reverso. Afinal agora com uma criança por perto, com a minha querida afilhada a ter cada vez mais a noção do mundo que a cerca, ela é a luz. Não aquela luz ofuscante das ruas, ou intermitente que decora as árvores nesta época. Ela é uma luz serena e firme, de sorriso largo, personalidade vincada. Ela é a alegria neste meu mar de angústia. Ela é a luz neste meu final de caminho marcado pela escuridão que teima em não se dissipar. Ela representa os Natais da minha infância despreocupada onde ainda não havia lugar para a angústia ou desilusão. Ela representa a inocência duma criança, a criança que eu fui há muitos anos atrás, que pensava que os brinquedos vinham pela mão do Menino Jesus - ainda não havia o culto do Pai Natal que hoje existe - numa encenação que os meus avós faziam a preceito ano após ano. Ela é a estrela brilhante, guia não dum qualquer Rei Mago, mas dum ser frágil, - como todos os seres, embora na nossa arrogância pensemos o contrário -, que se interroga a todo o momento sobre o sentido da vida. Já muito tempo passou. Já muitas coisas aconteceram. Muita água deslizou sob as pontes. Muitos Natais decorreram. Mas a Inês converteu-se numa espécie de livro de memórias que me aconchega nesta noite tradicionalmente fria de Dezembro. E assim consegue amenizar toda esta angústia que me repassa a cada ano. Porque tal como este virar de calendário em busca duma redenção, a Inês é ela mesma a minha redenção. Mas apesar de tudo isto que aqui deixo, nada me impede de desejar um Feliz Natal a todos! Àqueles de quem gosto, como àqueles de quem não gosto tanto, bem como àqueles que não gostam de mim, que com a sua presença vão enriquecendo a minha existência, ensinando-me a aprendizagem constante da vida. Aos animais que já me encheram de alegria com a sua existência na minha vida, mas também com a dor da sua ausência, para já não falar dos que para aí sofrem. À natureza que nos envolve e nos permite viver num  mundo menos árido e agreste onde a vida se tornou possível apesar de tudo. Por tudo isto estou grato a todos. Em paz comigo mesmo tanto quanto me é possível. Por isso vos desejo um Feliz Natal e um Ano Novo de 2015 pleno de tudo aquilo que são os vossos mais profundos desejos, de tudo aquilo que são os vossos mais recônditos sonhos! Boas Festas para todos!

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