Navegando num mar de equívocos
As eleições aproximam-se e as lutas partidárias começam a tornar-se cada vez mais claras e evidentes. Os partidos, - sobretudo os chamados do "arco da governação", coisa a que nunca me hei-de habituar -, até parece que se dão mal e que daí a pouco tirarão das bainhas os seus sabres bem afiados para cortar os adversários às postas! Puro engano. Sempre tem existido uma certa sobreposição (nas franjas, obviamente) entre os vários executivos e os partidos que os compõem. Disso nem sempre os portugueses têm consciência, mas é assim. Não que isso me incomode de todo. Até é uma prática muito usada nas democracias do norte da Europa onde a civilidade é mais vincada e pragmática. Lembro-me do tempo em que se criticava Soares, nos idos anos de 70 e 80 do século passado, quando depois de acesos debates na Assembleia da República (AR), iam todos almoçar ao Tavares - conhecido restaurante de luxo lisboeta que, tanto quanto julgo, encerrou não resistindo à crise - independentemente das cores partidárias. Não sou contra, mas acho que deveria haver mais transparência nas atitudes. Não será com certeza nenhuma vergonha que um partido quando chega ao poder adote uma política dum outro executivo anterior, se ela for boa, independentemente do partido que a subscreveu. Esta falta de clareza é que me traz angustiado, e serve sempre de arma de arremesso a todos aqueles que não acreditam na democracia, para tentar minar os seus alicerces. Mas voltando a este tema, dir-vos-ei que este executivo não foi exceção a esta regra. Talvez não saibam mas quando este governo entrou em funções o desnorte era terrível. (Coisa que aliás, parece continuar até aos dias de hoje. Basta ver a decisão de criar programas para que os emigrantes jovens regressem, quando há algum tempo atrás, se incentivasse a que emigrassem). Mas o desnorte levou a que este governo tivesse pedido a colaboração a elementos do governo anterior, alguns bem próximos de Sócrates. Coube a tarefa a Carlos Moedas que foi buscar Costa Pina que tinha sido o secretário de Estado do Tesouro e das Finanças do governo de José Sócrates. E, ironia das ironias, foi este que viria a ser protagonista da primeira grande aquisição para o executivo de Passos Coelho / Portas, quando foi buscar o socialista Pedro Ginjeira que tinha sido durante anos o braço direito de Ana Paula Vitorino, quando esta foi secretária de Estado dos Transportes no primeiro governo de Sócrates. E este, viria a trazer mais dois seus correlegionários António Vicente e Paulo Leiria, que iriam desbravar o caminho a Carlos Moedas no seu cargo de ligação com a "troika". Contudo, não foi só Moedas que recorreu a executivos da governação anterior. Vítor Gaspar também o fez, quando trouxe para junto de si Inês Drummond que tinha sido técnica do Ministério das Finanças e ainda tinha sido diretora do GPEARI - Gabinete de Planeamento, Estratégia, Avaliação e Relações Internacionais e assessora de Álvaro Aguiar, o economista-chefe da equipa de Teixeira dos Santos nas Finanças. Como se vê, quando aparecem a degladiarem-se nas televisões ou na AR, mais não se trata do que pura encenação para povo ver. Como atrás disse, não me custa aceitar isto, o que me parece é que deveria haver mais transparência quando se fazem alguns ataques suezes apenas para português ver. Penso até que esta interligação é boa para a democracia e para a continuação da governação, mas também serve para termos a perceção de que, afinal, quando vamos a votos talvez não tenhamos bem a noção de que existem zonas cinzentas em que a política é fértil. O importante é que se fosse acabando com este mar de equívocos, mas com eleições à vista, todos continuarão na saga habitual. Até porque o alimentar de clivagens pode ser importante para muitos que necessitam da sua eleição para continuarem empregados, caso contrário, seriam mais uns tantos que não sabem fazer mais nada a engrossar a já malfadada estatística do desemprego. (Alguns que até não esconderam a regozijo quando Sócrates foi detido). Basta olhar para o nível desta AR comparada com outras do início da nossa democracia para se perceber do que estou falar. Navegamos num mar de equívocos que a ninguém interessa clarificar porque afinal essa também é a ilusão duma democracia. Mas apesar disso, ainda não se descobriu regime melhor. Assim, pelo sim e pelo não, é bem melhor ficarmos com este.
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