O grito do desespero
Estamos todos a assistir àquilo que pode ser uma semana única e histórica. A Grécia perdeu o medo e jogou uma cartada forte. Penso até que tal deriva de ter já assegurada uma qualquer saída da situação caso as coisas corram mal na União Europeia (UE), caso contrário, será um suicídio. Mas um simples gesto dum povo humilhado e ofendido fez tremer muita gente. Por cá, o governo ultraliberal mantém-se em "blackout" a ver no que a coisa dá. Se por um lado, tudo correr mal à Grécia podem sempre acenar com um qualquer fantasma para assustar o eleitorado, mas por outro lado, também, porque sabe que nós iremos sofrer as inevitáveis ondas de choque. (Basta ver o que está a acontecer nas bolsas e a nossa foi uma das que caiu mais juntamente com a italiana, isto é, os dois países que estão na linha da frente da especulação financeira. Quanto às afirmações do Presidente da República nem perderei tempo em comentá-las). Que irão acontecer estas ondas de choque ninguém tenha dúvidas - deriva da teoria económica - e aí veremos se a "teoria dos cofres cheios" vale. (Já agora, cofres cheios de dinheiro emprestado para pagar dívidas). É que podemos ter muita comida (leia-se euros) para uns meses, até ao fim do ano ou pouco mais, e depois? É que ninguém sabe o tempo e as consequências de tal situação. Entramos num buraco negro que não conhecemos e do qual nem sequer sabemos como sair. O nervosismo mesmo da poderosa Merkel dá bem a entender o receio dos restantes 18 da zona euro face a uma possível saída da Grécia. A corda esticou demasiado e nunca ninguém pensou que os gregos fossem capazes de dar um murro na mesa. Até Obama não deixou de intervir, afinal a Grécia é importante do ponto de vista estratégico e parece que só ele vê isso. Não sou adepto do Syriza mas acho que Varoufakis e Tsipras só fizeram aquilo que deviam fazer. Face a mais austeridade, que até agora não produziu qualquer resultado visível, consultam o povo para saber que caminho devem trilhar. Afinal a democracia é isto. Apenas alguns senhores de ocasião da UE o esqueceram habituados a ter governos submissos que aceitam as humilhações sem pestanejar como o nosso. Para que não restem dúvidas, devo aqui fazer a minha declaração de intenções - repeti-la, será o termo mais correto - de que sou a favor da Europa, do euro e até me situo no campo daqueles que defendem o federalismo. Só que não me revejo nesta Europa arrogante, não solidária, apenas apostada em fazer vingar os pontos de vista dos mais forte (do norte) contra os mais fracos (do sul). Esse não é, nem nunca foi o projeto europeu idealizado por Jean Monet. Seja como for, aconteça o que acontecer, a Grécia, país que deu ao mundo a democracia, mostrou que já chega. O grito de desespero foi profundo. A fera ferida na sua dignidade foi buscar as últimas forças. Como se diz na terra de Sócrates e Platão "quando se está totalmente encharcado já não se teme a chuva". Um ditado popular que encerra muita sabedoria. Para quem a quiser aproveitar. Apesar de tudo, penso que haverá um acordo. Mais brando seguramente para os gregos. O medo instalado na Europa que vai mostrando a sua real fragilidade é um dado. "Se o euro falhar falha a Europa", dizia ontem Merkel. Parece que só agora deram por ela.
0 Comments:
Post a Comment
<< Home