Orientalismo, exotismo e outras estórias
Sempre a Europa assumiu o seu desenvolvimento - mesmo na construção de Estados - por contraste com outras culturas, nomeadamente, as provindas do oriente. Tal é muito patente na arte, sobretudo, na música. Quando caminhamos pela arte musical - não me refiro à canção ou ao artista da moda sempre redutores - acabaremos por perceber muito do que a História nos mostra. Veja-se o caso de Portugal (a primeira nação templária como já aqui referi noutra oportunidade) desenvolveu-se com os mouros numa antítese que se replicou em outras paragens. O caso do império austro-húngaro que se serviu da invasão otomana que muito preocupou Viena, para se exercitar com os laivos do nacionalismo que mais tarde, já numa outra configuração histórica, tão maus resultados deu. A Europa centrada no seu umbigo ia desfilando música que, antes mesmo de retratar uma cultura diferente, a ridicularizava (por a tornar mais caricatural) para servir os seu propósitos. O caso de Berlioz que nos trouxe o exotismo do oriente para formar o nacionalismo gaulês. Nacionalismo que atingiu o seu apogeu na Itália com Verdi - caso da ópera Aida - ou com Puccini - caso da Madame Butterfly - que escreveram páginas que se pretende ímpares na música mas que não são mais do que a visão sobranceira por outras culturas que, na maioria dos casos, nem sequer entendiam. (O caso da Madame Butterfly é bem típico. Foi a primeira ópera que assisti de Puccini e nunca mais gostei deste compositor por mais sublime que fosse a música. A postura desinteressada do marinheiro americano face à apaixonada japonesa e por ele usada no pós-guerra, marcou-me para sempre e pelas piores razões). Nos dias mais recentes outros artistas assumem mais uma atitude de caminho de evolução histórica e não tanto de esmagamento das outras culturas. É o caso de Loreena McKennitt no seu álbum 'An Ancient Muse' que nos trás o caminho que os celtas (que também passaram pelo nosso país) foram caminhando para oriente e encontraram a cultura mongol e se interligaram - sem perderem as respetivas identidades - criando algo de muito belo em música. Caso bem diferente do 'Coro dos Escravos' de Verdi, que amesquinha as culturas exógenas, ridicularizando-as até certo ponto. Portugal como país periférico, nunca contribuiu para esse exotismo na música que levaram alguns grandes compositores como os já citados Verdi, Puccini, Berlioz, mas tantos outros, como Tchaikovsky com a imitação chinesa estilizada, ou Borodin com o sentido das estepes vistas por um citadino. Nenhum compositor português se viu na necessidade de desenvolver esse filão à sombra de outros, porque a nossa cultura nunca foi assumida por terceiros. O caso mais curioso é que a Filarmónica de Berlim nunca tocou a música de Luís de Freitas Branco embora ele tenha vivido uma boa parte da sua vida em Berlim e tenha lá produzido muita da sua música. Por vezes o ser periférico tem as suas vantagens porque se está numa zona de menor trânsito onde as coisas podem ser vistas com mais clareza. Como diz Edward Said (o mesmo que juntamente com o israelita Daniel Baremboim criou a orquestra Ocidente-Oriente) no seu livro 'Orientalismo', sempre que o Ocidente olhou para a cultura Oriental não foi para a divulgar, admirar, mas sim com a sobranceria do exótico ridicularizado até à caricatura, esmagando-a, sempre com o propósito de exaltar uma Europa - ou melhor o Ocidente - porque tal não se fica só pela Europa. Mas o mesmo aconteceu com outras paragens nomeadamente da Latino América e até de África. Como me dizia um amigo quando conversávamos sobre esta temática, era como o caso da última página do 'Tintin no Congo' que nunca deveria ter sido escrita. O mesmo para muitas outras obras de arte, nomeadamente no campo da música, onde esta questão se coloca com mais evidência. Muito ainda havia para dizer mas ficará para outra oportunidade.
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