A hipocrisia
Este dia 10 de Junho, embora sendo um símbolo nacional, não deixa de estar pejado de hipocrisia. Noutros tempos foi aproveitado para justificar o injustificável. Éramos o tal povo heróico, afável, que não cometia atrocidades nas colónias como os outros, enfim, éramos o exemplo. Das batalhas éramos os melhores, abençoados por Deus para tornar mais justificável as guerras, esquecendo que guerras são sempre guerras, e não há guerras justas, e assim íamos cantando e rindo ao ritmo de então, que era aquilo que a escola nos inculcava. (Alguns de nós, onde felizmente me incluo, tiveram acesso a outros mundos e a outras visões, bem cedo na sua ainda muito jovem existência, o que nos levou a questionar algumas coisas). Hoje assiste-se ao mesmo de sinal um pouco contrário mas com a mesma finalidade. Mas tudo isto vem a propósito de algo que ouvi esta manhã no meu habitual 'jogging'. Tratava-se de celebrar este dia com Camões como pano de fundo, fazendo o contraponto com Gil Vicente. E fui pensando como os tempos mudam e com eles as vontades. Camões tal como Gil Vicente foram uma espécie de marginais do seu tempo. (No seu tempo seriam considerados anarquistas, esquerdistas, - se estes adjetivos existissem na altura -, gente de má índole, a quem os poderosos de então olhavam de soslaio e com muitas reservas). Ouço falar deles por alguns 'ideólogos de pacotilha' como símbolos nacionais. Mas será que essas pessoas, se tivessem vivido nesse tempo, lhes teriam sequer franqueado o umbral das suas portas? Duvido que o fizessem. Mas isso não é exclusivo dos portugueses. Ainda à pouco tempo vimos a celebração de Jeanne D'Arc em França. E logo os mesmos 'ideólogos' a brandir as suas bandeiras, esquecendo que ela que tanto deu a França acabou na fogueira condenada pelos poderes de então. Como é fácil de constatar a hipocrisia anda por aí e não é exclusivo da terra lusa. Por isso eu olho sempre com reservas para estes dias porque por trás deles existem sempre estórias que a maioria não conhece ou que pretende ocultar varrendo-as para debaixo do tapete. Isto não quer dizer que não o celebremos, mas que o celebremos de espírito largo e não com a tacanhez que por vezes por aí se vê.
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