Vandalismo sem rosto
Temos vindo a assistir a uma fobia global consubstanciada no ataque a estátuas ou símbolos históricos. Portugal não foi exceção. Assistimos a um daqueles ataques vis à História dum povo quando se vandalizou a estátua do Padre António Vieira. E acho que esta situação merece uma particular investigação das autoridades, como parece que está a acontecer. O Padre António Vieira foi uma das figuras mais influentes do século XVII dentro daquilo que era o mundo conhecido de então. Um grande diplomata, um defensor dos indígenas, um anti-esclavagistas, um pensador dos melhores do seu tempo. Sabemos que no século XVII e muito tempo depois, (ainda tal se verificava no século XIX e basta ler a correspondência de Eça de Queiróz), a escravatura era socialmente aceite como algo natural e até divino. Mas mesmo assim, o Padre António Vieira se lhe opôs e teve alguns dissabores com essa sua atitude. Só a ignorância ou a má fé podem justificar tal ato. Sou um grande admirador desta nossa figura histórica. Quem me segue neste espaço, terá notado que recorro muito aos seus escritos para sustentar muitas das minhas ideias. Por isso, não gostei do que vi e contra tal me indignei. Mas quando disse que gostava que as autoridades esclarecessem cabalmente este caso é porque acho que ele tem contornos estranhos. Porque se foi feito por gente ignorante, pois teremos que os ajudar a compreender a História do seu país para que tal não se repita; se foi com outras intenções, por exemplo, a de denegrir as manifestações anti racistas estaremos perante algo bem diferente. E não pensem que é tão absurdo assim. Ainda na passada sexta feira apareceu uma petição - no mínimo ridícula como afirmou o bispo auxiliar de Lisboa - a alertar para que havia forças esquerdistas que queriam destruir os monumentos nacionais como os Jerónimos ou a Torre de Belém! Tudo muito ridículo que parece que foi patrocinado por gente da extrema direita e que o Chega logo aproveitou para cavalgar. Mas a coisa durou pouco porque 'mais depressa de apanha um mentiroso do que um coxo' como se diz no jargão popular, e foi isso mesmo que aconteceu. Daí a necessidade de clarificação do sucedido e a devida punição a quem cometeu tais atos de vandalismo sem rosto, como todos os atos de vandalismo. Que se manifestem contra o racismo acho muito bem - até é um ato cívico a que a própria Google não ficou indiferente - mas que tal sirva para outros fins, isso não. Tudo à boleia dum criminoso racista que por usar uma farda de polícia achou que tudo lhe era permitido. Estava longe de pensar no que ia acontecer. Talvez agora já esteja arrependido porque o mediatismo deste assassinato passou fronteiras e enxovalhou um país inteiro. Foi contra gente desta (criminosa e assassina como este racista americano) que o Padre António Vieira se insurgiu. É bom que não o esqueçamos. E já agora, quem o fez, (se o fez por ignorância), aproveite para o ler.
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