Carta aberta ao meu ilustre colega Rui Rio
Com os meus melhores cumprimentos.
Hesitei se deveria vir a terreiro expor-te as minhas preocupações. Depois de alguns dias de reflexão resolvi ir em frente. É o que estou aqui a fazer. Faço desde já a minha declaração de interesses. Não sou político e não pertenço a qualquer partido.
Já vão longínquos os tempos em que as nossas vidas se cruzaram na Faculdade de Economia do Porto. Algumas décadas volvidas ainda recordo algumas conversas que tivemos. Do modo como me dizias que a figura carismática de Sá Carneiro te tinha marcado e que tinha despoletado a tua vontade de aderir ao então PPD.
Habituei-me ao teu desassombro, à tua integridade e honestidade que viriam mais tarde a ser a tua chancela quando foste eleito Presidente da Câmara do Porto. Durante anos, sempre afirmei aos meus amigos - ou em conferências em que participava - que tu eras o modelo de político que gostava de ver replicado no meu país. (Então ainda nem eras Presidente da Câmara Municipal do Porto). Continuo a pensar o mesmo, embora agora lhe coloque algumas reticências.
Aquilo que fizeste nos Açores deixou-me atónito. Porque sei que és um democrata e defendes valores bem diferentes doutros que fazem da xenofobia, racismo e outros coisas que tais, a sua marca ideológica. Sei que tens muita oposição interna e que precisas de aparecer como vencedor de algo. Só que escolheste o momento errado e o parceiro inimaginável. Em política não pode valer tudo.
Não basta vires dizer que é só regional e não nacional o acordo que foi feito, todos sabemos que não é assim, basta ler o Expresso da semana passada. E com isso, só vieste dar uma ajuda preciosa a quem não te quer a liderar o PSD. (Se calhar colocaste a primeira perda na tua sepultura política, só que não foi uma pedra qualquer, foi um pedregulho).
Há quem diga que a tua índole autoritária afinal atingiu o seu clímax. Sei que tem essa vertente de autoritarismo - talvez fruto da tua educação alemã - mas, sei também, que ter autoridade não significa ser ditador (ou defensor de ditadores). Nunca o fizeste e quem a isso recorre não pode estar de boa fé. Mas que há coisas impensáveis, lá isso há, e o que fizeste nos Açores, para além de te ajudar, poderá vir a ser um engulho monumental para ti e para o teu partido.
Questionar-me-ás porque venho a terreiro com esse assunto se nem militante do PSD sou. Pois é verdade, não sou militante de nenhum partido como atrás referi, mas sou um cidadão preocupado com o meu (nosso) país. Tal como tu o és. E só isso me motivou.
(Agora até já me cobram as afirmações elogiosas que em tempos fiz sobre ti. Vê bem ao que as coisas já chegaram).
Mas continuo a acreditar que continuas a ser o mesmo Rui Rio doutros tempos. Com certeza diferente - tal como eu - que vamos mudando consoante a idade e a experiência de vida se faz sentir. Por isso, espero que corrijas a mão e não voltes a cometer esse erro que te pode ser fatal. Para mim, continuas a ser um homem sério, honesto, íntegro e democrata tal como te conheci há muitos anos atrás.
Aceita esta crítica com abertura de espírito. Sei que o farás. Afinal o que está em causa é o bem do meu (nosso) país. E sei também que não venderás as tuas ideias por um prato de lentilhas. Assim espero. Assim quero acreditar.
E assim termino, com a clareza e desassombro que me conheces, mas também com a crítica construtiva - porque séria, respeitosa e sem outros dúbios interesses - que aqui produzo.
Aproveito para te endereçar os meus melhores cumprimentos e subscrevo-me.
Atentamente.
José Ferreira
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