600 anos depois, Bento XVI resigna
A notícia caiu como uma "bomba em céu sereno" para usar as palavras do cardeal Angelo Sodano. Bento XVI abdica de papa, aparentemente por motivos de saúde e de fragilidade física. Todos sabemos que o cargo é exigente. Todos sabemos que Bento XVI não teve um período fácil para gerir a Igreja. Mas mesmo assim, a notícia não deixou de ser surpreendente. Os escândalos que têm abalado a Igreja, sobetudo, os casos de pedofilia, não terão sido as coisas mais fáceis de gerir. O escândalo da fuga de informações por parte do seu secretário, homem de muita confiança desde há muitos anos, num caso que ficou conhecido pelo Vatileaks, abalaram a confiança do Papa nas pessoas que o rodeavam. Passou a não saber em quem confiar, e quando começamos a viver rodeados de sombras, a pressão deve ser avassaladora. Há quem afirme que o Papa quis dar um sinal de que o Vaticano se tornou ingovernável. Talvez tenha sido isso, mas a dificuldade de governar tamanha "nau" sempre foi algo que atravessou os tempos. Todos os que andam mais ligados à História, e sobretudo, à História das Religiões, sabe que o Vaticano nem sempre foi um local calmo e tranquilo. Porque se envolveu demasiadas vezes em lutas pelo poder efémero e terreno, temporal, porque foi cobiçado pela política dos tempos, por interesses nem sempre da sua matriz original, o Vaticano não foi, de facto, um local tranquilo como deveria ter sido, como deveria ser. A diplomacia do Vaticano é sobejamente conhecida, as teias que o poder, a política e até o dinheiro tecem não foram exteriores ao Vaticano. Todos se lembrarão do escândalo do Banco Ambrosiano, no consulado de João Paulo II, e dum dos seus dirigentes principais ter aparecido enforcado na Torre de Londres, aparentemente como sendo suicídio, ou apenas como uma justificação que dá jeito. Seja como for, cansado pelos anos, pela doença, Bento XVI achou que devia deixar o lugar a outro. Bento XVI nunca se afirmou duma forma efetiva junto dos fiéis. Ele é muito introvertido, tímido segundo os mais próximos, um intelectual brilhante, talvez o mais brilhante deste tempo de facilitismos. Mas a tarefa não era fácil. É sempre difícil substituir alguém com a dimensão de João Paulo II. Quando Joseph Ratzinger assumiu o lugar, com certeza que estava ciente disso mesmo. Depois dum magistério longo e tão querido pelos fiéis e mesmo por aqueles que não o eram, mas admiravam a sua personalidade, como foi o de João Paulo II, quem se apresenta a seguir terá enormes dificuldades, e quando já tem alguma idade, ainda mais difícil se torna a tarefa. Seja qual seja a razão, Bento XVI assumiu uma posição histórica quando toma a decisão de abdicar. Algo que já não se via desde o século XIV, quando Gregório XII o fez num pontificado que durou de 1406 a 1415. Agora coloca-se o problema da sucessão. Há quem defenda um papa de fora da Europa e que seja também mais jovem. Penso que se está no tempo de definir o perfil do candidato. Mas que seja alguém que abra a Igreja aos novos tempos, que consiga congregar os fiéis e trazê-los de novo para o seio da Igreja. Numa Europa grandemente descristianizada, há muito trabalho pela frente, muito terreno para lavrar e cultivar. Talvez que a imagem punjente do raio a atingir a cúpula da Basílica de S. Pedro horas depois do anúncio do Papa, seja um sinal. Os livros de profecias abrir-se-ão de novo, as interpretações começarão a circular por aí, as leituras aparecerão a todo o momento. Mas agora é tempo de reflexão. Como é costume nestas ocasiões, os cardeais dizerem que esperam a inspiração do Espírito Santo para escolherem o novo sucessor. Espero que assim seja para bem da Igreja e dos seus seguidores.
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