Turma Formadores Certform 66

Thursday, June 12, 2014

Deflação em Portugal: quarto mês consecutivo de queda de preços

A variação homóloga do índice de preços no consumidor foi em Maio de 2014 negativa em quatro décimas. Esta é uma das quedas mensais, em valores negativos, mais significativas da história recente e foi suficiente para fazer cair a taxa de inflação (a variação média anual dos preços no consumidor nos últimos 12 meses) para 0,1%. Ou seja, nos últimos 12 meses, o cabaz de compras que o INE considera referencial para acompanhar a despesa dos consumidores em Portugal, praticamente não aumentou de preço. Podemos voltar a falar de deflação em Portugal. Recorde-se que ontem mesmo o Banco de Portugal reviu as suas previsões para a taxa de inflação em Portugal no final do ano de 0,5% para 0,2%. Sublinhe-se que maio é o quatro mês consecutivo em que se regista uma variação homóloga negativa do índice de preços no consumidor. Foi, em parte, devido a uma queda global dos preços na Zona Euro no mês de Maio que o Banco Central Europeu se decidiu na passada semana (ver “BCE passa a exigir pagamento aos depositantes“) a tomar medidas que visam penalizar a poupança, em favor do consumo e da concessão de crédito (supostamente a atividades produtivas e não indutoras de bolhas especulativas). O cenário de deflação ganha assim maior credibilidade e as suas ameaças, particularmente nefastas para os devedores, adensam-se. Vale a pena reler os nossos artigos: "Se os preços começarem a descer em vez de subir não é bom" e  "Porque é que a deflação é catastrófica para Portugal?" No primeiro diz-se "Imagine que tinha a certeza absoluta que amanhã tudo estaria um pouco mais barato do que hoje. E imagine que muito provavelmente depois de amanhã tudo estaria ainda um pouco mais barato. Imagine até que seria muito provável que daqui a um ano aquela compra que está a projetar fazer lhe sairia muito mais barata. A deflação é isto; o simétrico da inflação. Se uma subida acentuada e regular dos preços cria um incentivo para não comprar amanhã aquilo que pode comprar hoje, com a deflação sucede o inverso. E, naturalmente, aos poucos, a deflação ir-se-á transmitindo a todos os preços não esquecendo que os salários também são um preço, o preço do trabalho.Um período de inflação moderada e muito limitado no tempo não é necessariamente uma catástrofe, assim como não é convivermos com taxas de inflação moderadas, claramente abaixo dos dois dígitos, contudo, “ligar” e “desligar” a inflação/deflação não são tarefas inteiramente controláveis. E pela descrição que fizemos é fácil de constatar que o poder da expectativa de descida de preços sobre as decisões de compra pode criar uma bola de neve onde, para se vender, haverá incentivo para descer o preço de modo a cativar o cliente reticente, podendo com isso estar a contribuir para aumentar ainda mais a expectativa de descida de preço e eternizando o ciclo com consequências potencialmente devastadoras para a atividade económica.Um dos exemplos mais conhecido de deflação duradoura com graves consequências ao nível do tolhimento da atividade económica será o Japão que desde os anos 90 tem vindo a enfrentar sem sucesso este problema (ainda que, por estes dias, esteja a tentar algo novo face às opções até aqui utilizadas)". E no segundo  pode ler-se: "A surpresa da descida da taxa de juro de referência do Banco Central Europeu para novo mínimo histórico (0,25%) encontra na evolução da inflação na Zona Euro uma importante justificação. Mesmo nas economias mais dinâmicas da zona euro, como a Alemanha, a evolução dos preços tem sido de forte desaceleração. Com as perspetivas de crescimento económico a serem revistas em baixa e com o risco de se entrar num processo de descida (e não de subida) de preços, ou seja, de deflação, o BCE terá antecipado este estímulo que visa dinamizar a atividade económica desincentivando a poupança e estimulando o consumo. O nosso leitor poderá perguntar: Se os preços começarem a descer em vez de subir não é bom? Pois a resposta está precisamente no artigo com esse título que aqui publicámos já este ano quando se começaram a detetar os primeiros sinais de que o risco de deflação em Portugal é real. Recorde-se que, em 2009, já tivemos um ano em que ocorreu uma efetiva descida dos preços de 0,8%. Mas acrescentemos alguns detalhes. No caso português, país devedor, a inflação poderia contribuir para ir facilitando progressivamente o pagamento da dívida precisamente porque esta está contratada num valor fixo e, como tal, vai-se tornando menos árdua de pagar à medida que os preços (do que exportamos, por exemplo) forem subindo. Na prática, a inflação funciona como um imposto escondido sobre os credores pois erode a taxa de juro que cobram pelo que emprestaram e pode até erodir o próprio capital. Como? Vejamos um exemplo: Se alguém empresta 100 a uma taxa de 3% no período mas durante esse mesmo período do empréstimo a inflação for de 5%, isso significa que no final do prazo, para comprar o mesmo cabaz que comprava com 100 no início precisará de 105 e, contudo, só receberá 103. Ou seja, os 100 que emprestou e os 3 de juro (esquecemos aqui os impostos para simplificar). Ao mesmo tempo, o devedor pode ter conseguido que aquilo que vendia a 100 possa ter passado a ser vendido a 105 e, consequentemente, terá libertado mais capital para pagar a dívida, os juros e ainda reter alguma coisa extra, tudo apenas por efeito da variação dos preços (esquecemos aqui também o retorno do investimento feito com o empréstimo para simplificar). Ora se em vez de inflação existir deflação, o efeito é precisamente o oposto, constituindo esta uma sobrecarga sobre o devedor que recebe cada vez menos pelo que produz e continua a ter uma dívida contratada num valor imutável e, em termos práticos, cada vez mais difícil de conseguir pagar. Um cenário de deflação ou mesmo de inflação baixa é particularmente dramático para um país, empresa ou família que esteja a tentar pagar a sua dívida. Vários economistas antecipavam este cenário como consequência do esforço unilateral de ajustamento feito pelos países do sul da Europa (esmagando salários e procura interna) combinado com a coincidência temporal de alguma austeridade em países do centro, mesmo entre os que registam excedentes sucessivos há vários anos. Do efeito contracionista conjunto sobre o consumo privado pode ter nascido esta evolução que levou os preços para crescimentos muito baixos, com risco de se tornarem negativos. A reação de hoje do BCE denota algum alarme com esta queda rápida dos preços de forma generalizada na Zona Euro. Bastará? Provavelmente, de forma isolada, não. Mas voltemos à deflação. Se um alemão lhe pode explicar quais os riscos da hiperinflação (recordando o que aconteceu há cerca de 100 anos no seu país), um japonês pode explicar-lhe os riscos de acreditar que amanhã o preço vai ser sempre mais baixo do que hoje, recordando-se do que se passou no Japão nos anos de 1990 até praticamente hoje. Em rigor, o Japão ainda está a tentar ultrapassar definitivamente o fantasma de um regresso à deflação que abandonaram marginalmente há alguns anos". Atenção a este fenómeno de que ninguém fala, sejam políticos ou economistas, vá-se lá saber bem porquê, e que é um dos mais graves que pode acontecer a uma economia desenvolvida.

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