Mário Soares completa hoje 90 anos de idade

Conheci Mário Soares há 40 anos. Estávamos então em 1974 e o prenúncio do chamado "Verão quente" já pairava no ar. A figura mítica de Mário Soares era o garante duma democracia tipo ocidental e da não radicalização do então jovem regime. Ele veio ao Porto, e fez a famosa travessia do mercado do Bolhão, - acompanhado por alguns "notáveis" do seu partido, donde se destacava o já falecido Salgado Zenha, iminente advogado do Porto -, local típico desta cidade e das suas gentes, que político algum não queria evitar. Nesse dia esperavam-se problemas quando ele chegasse. Havia tensão no ar. O espaço estava a abarrotar de gente. Repórteres de várias partes do mundo. Mas ele, como faria muitas mais vezes, torneou a segurança e entrou pela porta contrária. Depois do nervosismo da situação, logo tudo se foi ajustando a mais esta diatribe "soarista". Logo ele mergulhou na multidão, em breve foi levado em ombros pelos povo, sim, aquele povo mais genuíno do Porto que vi-a nele o garante duma liberdade à tão pouco tempo reconquistada. Depois de passado este burburinho, e quando houve tempo para o escutarmos mais de perto, descobríamos um homem afável, pleno de graça, com o chiste e a anedota na ponta da língua, a brincar com as situações. Depois segui os seus passos sempre firmes na defesa da democracia. Não sou militante de nenhum partido político, (nem do de Mário Soares), mas acho que todos lhe devemos muito pelo que fez pela democracia em Portugal. Ainda hoje, aos 90 anos, ele é uma voz firme e incómoda. Aquela voz que mais parece a consciência acusadora de certas diatribes que por aí se passam. Daí a incomodidade que provoca. Mas ele não olha para trás, não tem medo. Afinal para quem enfrentou a ditadura do Estado Novo, para quem esteve doze vezes preso pela PIDE/DGS - a polícia política do anterior regime -, para quem sofreu as agruras do exílio, não pode ter medo. E ele não o tem quando aponta as situações a dedo, as denuncia desapiedadamente, as estigmatiza e as põe a nú. Porque Mário Soares é assim mesmo. Uma força da natureza. Um democrata de parte inteira. Um "animal político" como lhe chamou a jornalista italiana Oriana Fallaci. Mário Soares nasceu a 7 de Dezembro de 1924 em Lisboa. Licenciado em Filosofia Românica e em Direito muito fez na defesa de muitos democratas presos pela polícia política da ditadura. De decano da democracia portuguesa, foi seu Primeiro-Ministro e Presidente da República, até ao símbolo que é. Daí o não ser surpreendente, ver no almoço de homenagem, gente dos mais variados setores políticos e ideológicos, bem como, gente dos mais variados saberes, irmanados numa causa comum, homenagear Mário Soares. Hoje é dia de lhe prestarmos esta homenagem pelos seus 90 anos de idade. Parabéns, Dr. Mário Soares!