E agora Europa?
É dos livros que por muito esticar a corda ela acabará por rebentar. Foi o que ontem assistimos na Grécia. Depois dum povo ser martirizado, reduzido quase à indigência que outra coisa se poderia esperar mais? A teoria da austeridade pode resultar em períodos muito particulares e sobretudo curtos. Nunca com a extensão que a "troika" impôs a vários países, entre eles a Grécia, mas também Portugal. Aqui o venho defendendo vai para quatro anos. Muitos comentários foram feitos em torno daquilo que escrevi e nem sempre os mais agradáveis. Contudo, alguns desses, afinal até parecem que estão de acordo com tudo isto que está a acontecer! O dia seguinte é sempre uma coisa terrível quando para além da confrontação técnica de ideias, se põe a ideologia de permeio. Depois é vê-los a correr a mudar de casaco, para se adaptar aos novos tempos. É certo que muito ainda se irá passar, muita discussão se irá travar, muitos conflitos se irão derimir. Mas duma coisa podemos estar certos, depois do que aconteceu ontem na Grécia nada ficará como dantes. Lembrem-se das pressões dos últimos dias sobre os gregos vindos do FMI, da Comissão Europeia, da Alemanha. Como foram percebendo que os gregos já não estavam com medo da mudança, começaram a adocicar o discurso, a criar condições para discutir com o novo primeiro-ministro grego. Uma atitude aviltante que em nada dignifica a Europa. Sobretudo a Europa solidária, - porque foi com este "leit-motiv" que foi criada a União Europeia -, e não a Europa de Merkel, sempre com os tiques autoritários típicos dos alemães, que produziram os ditadores mais ferozes, que quase destruíram esta mesma Europa. O equívoco começou logo com a criação do euro. A moeda única foi um passo muito importante no caminho duma Europa unida como espaço de liberdade e prosperidade. Só que bem cedo a Alemanha apossou-se da ideia e transformou o euro numa espécie de Deutsche Mark camuflado. A partir daí, era inevitável que as coisas não iam correr bem para todos, desde logo os países do sul. Não porque estes não quisessem trabalhar (como se tentou dizer) mas tão só porque estes países não produzem bens com um valor acrescentado tão importante como o que se produz na Alemanha, o que conduziria a uma distorção financeira duns países face a outros. Mas a Alemanha pouco se importou com isso. A mesma Alemanha que teve necessidade de ajuda externa no período logo após a reunificação. A mesma Alemanha que nunca cumpriu os critérios orçamentais do défice, - coisa que ainda hoje se verifica -, mas que acha que deve impor esse regime aos outros, esmagando os países, depauperando as populações. A Grécia está por tudo. Porque foi tão esmagada que não poderá ficar pior do que já está. Portugal é o que sabemos. Dívida que não pára de crescer, um forte desemprego (já estrutural), cortes na saúde a esmo, (e as mortes nas urgências bem o documentam), no ensino que está a produzir cada vez mais ignorantes (afinal isso é bom porque esses nunca contestam), vemos o país vendido a retalho a preço de saldo. Já nada é nosso e qualquer dia nem portugueses somos porque simplesmente Portugal já não existirá. (Talvez tenha sido comprado por um qualquer fundo especulativo com capitais chineses ou angolanos). Este é o legado que a austeridade e seus sequazes vão deixar. Por cá, temos um primeiro-ministro a ajustar-se ao novo fato. Afinal aquilo que sempre defendeu está em causa e terá inevitavelmente repercussões entre nós. Vimos o jogo de cintura que fez com a decisão do Banco Central Europeu, e vê-lo-emos seguramente com este caso da Grécia. Porque a partir de hoje, nada será como dantes. A Grécia cansou-se. Achou que já nada tinha a perder. Mesmo face aqueles que lhe incutiam o medo da mudança. Mas quando um povo acha que já nada tem a perder, se sente humilhado por muito tempo, mais cedo ou mais tarde, há-de revoltar-se. A vitória do Syriza é também a vitória dos outros países do sul. Expostos à mesma tirania alemã. E Alexis Tsipras será, seguramente, o futuro primeiro-ministro cuja vós representará não só a Grécia, mas também os outros países agredidos por esta austeridade sem sentido. O terramoto político a que ontem assistimos na Grécia pode ser o prenúncio duma nova alvorada. E agora senhora Merkel? E agora Europa? Estais satisfeitos com o vosso trabalho? Parece que ainda restam alguns com dúvidas. Desde logo, o presidente do Bundesbank, - Jens Weidmann - que ainda ontem ameaçava do cimo da sua arrogância, muito ao jeito nazi. Como já tinha feito depois das medidas anunciadas por Draghi a semana passada, que até incomodou a própria Merkel! (Afinal os alemães nunca se libertaram verdadeiramente desse tique nazi que lhes corre nas veias). Mas a História aí estará para lhe corrigir a mão. Afinal, como se diz por cá, "não há bem que sempre dure, nem mal que nunca se acabe". Este dia é o primeiro duma outra História que a Europa vai escrever. Mais solidária do que aquela que hoje conhecemos.
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