Turma Formadores Certform 66

Monday, August 01, 2016

Reflexões de verão - Das cruzadas do passado às cruzadas do presente ou simplesmente o olhar do outro

"Sexta feira 22 da  shabán do ano 492 de hégira. As lágrimas e o terror apoderaram-se da tranquila povoação de Al-Quds. Até esse dia, os seus habitantes sentiam-se especialmente afortunados por resistirem na terceira cidade santa do Islão, depois de Meca e Medina. Por alguma razão, os ulemás, os doutores da lei, preferem chamar-lhe Beit-o-Maqdes ou Al-Beit Al-Muqaddas, quer dizer, 'o lugar da santidade'. Dali, Maomé ascendeu aos céus, mas, na sexta feira 22 de shabán do ano 492 da hégira, Maomé parece ter-se esquecido de Al-Quds, a cidade a que os cristãos chamam Jerusalém. Um exército de ocidentais enlouquecidos pela sua fé irrompeu pela cidade depois de quarenta dias de cerco e o sangue dos seus habitantes inundou as ruas. Só os que fugiram conseguiram sobreviver para narrar a desgraça e testemunhar a profanação de Al-Quds. A Primeira Cruzada chegou ao fim, mas o confronto apenas começara. A queda de Jerusalém em 1099 marcou o início da presença efetiva de cristãos ocidentais na Terra Santa. A existência dos chamados Estados latinos ou francos marcou a vida política da zona durante os dois séculos seguintes, até à expulsão definitiva dos cristãos em 1291. Nesse tempo, a Ordem do Templo converteu-se num dos principais atores políticos, militares e económicos da zona, consagrando a sua atividade à defesa de terras que considerava legitimamente recuperadas para a cristandade. A coexistência de cristãos e de muçulmanos foi determinada pela complexa evolução política de ambos os mundos, de modo que as tensões internas de cada um deles marcaram tempos de encontro e desencontro tão fecundos como arbitrários. Não obstante, entre cristãos e muçulmanos não havia sintonia. Sabemos que os primeiros combatiam convencidos de que a razão os assistia, e não qualquer razão, mas a razão divina. Sabemos que por isso planificaram e executaram as muitas expedições armadas que conhecemos como cruzadas, e que até criaram braços armados colossais para a Igreja, como a Ordem do Templo. Mas o que sabemos do mundo ao qual chegaram? Que reações provocaram? E, sobretudo, como terá esse mundo compreendido a sua chegada e a sua presença a longo prazo? As respostas, sem as quais não é possível compreender a história das cruzadas e do Templo em toda a sua complexidade, encontram-se no olhar do outro." - In 'Templários, pág. 245. - História. O olhar do outro é sempre fundamental, porque se neste tempo o outro era o mundo muçulmano, hoje o outro somos nós. Porque em nome duma Fé matamos e morremos, ocupamos e destruímos. Tal como alguns muçulmanos acham que devem destruir a nossa civilização em nome duma outra Fé. (Curiosamente, uma Fé, que tal como a nossa, têm uma origem no mesmo tronco, daí o se chamarem 'religiões do Livro' juntamente com o judaísmo). Mas esta 'jihad' a que hoje assistimos tem muito a ver com as nossas cruzadas do tempo de antanho - no fundo o desenvolvimento do mundo muçulmano mais profundo está ao nível da nossa Idade Média que, já há muito, deixamos para trás -, mas os princípios, a tentativa desestabilizadora, destruidora e sangrenta vai no mesmo sentido, com os mesmos princípios, com afinal, um outro olhar -, o olhar do outro. Neste mundo conturbado que é o nosso, em que vemos os nossos valores atingidos, seria bom que meditasse-mos sobre tudo isto. É que afinal a diferença não é tanta assim, salvaguardado o tempo histórico que separa estes dois mundos. Quando ouvidos um grupo de fanáticos clamar pelo Al-Anadaluz - o antigo território de Espanha e de Portugal ao sul do Mondego -, temos que pensar que isto não é mais do que o fanatismo dum outro tempo - ele também obra de fanáticos -, em torno de Jerusalém, a Al-Quds muçulmana. Estamos a assistir a uma certa reversão da História, com outros protagonistas, mas com os mesmos fundamentos. Como dizia Leonardo Da Vinci: "O olhar de quem odeia é mais penetrante do que o olhar de quem ama". Afinal tudo não passa duma outra visão porque tudo está no olhar do outro, seja esse outro, quem for.

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