Questões de semântica mas não só
Tenho vindo a assistir ao que se passa na Venezuela com muita preocupação. Não conheço o país, mas desde muito pequeno, me habituei a ouvir falar das suas maravilhas naturais e da amabilidade das suas gentes. (O meu pai por lá andou vários anos e foi arauto destas minhas memórias. Os meus padrinhos de casamento eram oriundos dessa terra que tanto amavam). Mas esta minha preocupação com o que se passa na Venezuela, não pode deixar passar ao lado alguma hipocrisia que esconde, algo tão complexo quanto o que representa Maduro. Acho curioso - ou talvez não - que os EUA de Trump (mas poderia ser doutro qualquer) se apresse a impor sanções à Venezuela. Isto até pode ter o apoio de todos, mas eu não me esqueço da complacência dos EUA para com Pinochet que reduziu à miséria o Chile depois de o ter transformado num imenso cemitério, como a benevolência face à junta militar argentina ou à ditadura militar no Brasil. Já para não falar no Panamá ou mesmo na Cuba de Batista. Parece que para os EUA há ditaduras más e outras boas! O mesmo se dirá da UE que afina pelo mesmo diapasão. Sei que a confusão ideológica é por vezes benéfica para os ditadores que, ou obtém a concordância dos seus povos, ou a tortura e a morte arbitrárias farão o resto. Os extremismos serão sempre extremismos tenham eles o sinal que tiverem. Sei que as ruturas de regimes nunca são pacíficas, e mesmo quando o são, - como foi o caso português em 25 de Abril -, logo aparecem forças que pretendiam evitar que isso perdurasse como aconteceu com os movimentos de extrema direita que mergulharam o país no caos, mataram inocentes, tudo em nome de teorias já sem aderência, que contaram com apoios de alguma gente que, ainda hoje, se senta na nossa AR. Mas a minha geração ainda viveu muito o conflito da guerra fria, e também aqui, a distorção de teorias era evidente, para que dessem jeito para justificar as situações. Muitos jovens da minha geração aderiram ao marxismo e outros tantos rejeitaram-no. Só que nunca pararam para pensar o que afinal encerravam essas teorias. Marx, quer se goste quer não, trouxe um enorme contributo à sociologia e à economia, dentro dum outro arranjo fruto da escalada galopante da revolução industrial. Qualquer economista sério sabe disso. Mas uma coisa é falar de marxismo, outra é falar de marxismo-leninismo. São coisas diferentes embora pareçam iguais. Distorce-se aqui, remenda-se acolá, o importante é que, de novo, sirvam os interesses de quem os manipula. E aquilo que era uma teoria muito evolucionista do social e da economia, passou a ser a vestimenta dum regime ainda pior do que o de Maduro. E se isto poderá ser visto como incómodo para uma certa esquerda, se olharmos para a direita, tal não se afigura melhor. Foi um regime totalitário que arrastou o mundo para dois conflitos que arrasaram a Europa, e aqui, até foi mais complicado porque essas forças chegaram ao poder pela força do voto. Se foi uma eleição limpa ou não, não sei, mas nestas coisas talvez até nem seja o mais importante. (Curiosamente, ou tal vez não, o 'Mein Kempf' começa a ser um dos livros mais vendidos atualmente e não será, porventura, para defender a democracia). O que aqui pretendo relevar é esta questão semântica que, quase sempre, inquina o pensamento político-económico através dos tempos. Não pode haver regimes totalitários bons e maus. Há regimes totalitários e ponto. Porque não é assim, assistimos a coisas que tocam o surreal como a tentativa de não agressão efetiva com a Coreia do Norte - apesar da verborreia que indicia o contrário -, ou com a China - que se prefigura como a superpotência num futuro próximo -, ou mesmo com uma Rússia que de democrática apenas tem o nome. A semântica em política ou em economia, nunca foi o melhor dos mundos, e dessa ambiguidade saíram sempre regimes torcionários que esmagaram os seus povos, sem que ninguém se importasse com isso para além dos interesses imediatos. São questões de semântica mas não só. Por trás existe sempre uma espécie de cortina de fumo que esconde sempre outros desígnios bem longe do entendimento dos povos.
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