Turma Formadores Certform 66

Monday, January 15, 2018

Índice de desemprego e estatísticas

Depois da crise, a situação do desemprego tem vindo a melhorar duma forma clara nos últimos dois anos fruto duma alteração de estratégia política baseada numa certa forma de keynesianismo, bem diferente do postulado ultra-liberal vigente anteriormente. Isso é inegável por mais que torturemos os números ou torçamos as estatísticas. Contudo, é sempre bom olharmos com atenção para aquilo que lemos sobre a matéria porque a crise introduziu efeitos perversos na engrenagem que alteraram todo o perfil até então vigente. A crise levou a uma queda enorme do emprego, (essa era uma das prerrogativas do programa da 'troika'), bem como tornar a mobilidade maior. Isso é claro por mais que se tente dizer o seu contrário. Basta ler o memorando. Só que Portugal não é um país com as características dos países do norte da Europa, nem tem uma tradição de mobilidade que é regra em países como, por exemplo, os EUA. O desemprego aumentou em flecha e não subiu mais dada a onda de emigração que se verificou que foi transversal a várias faixas etárias. Mas o desemprego jovem continuou - e continua - a ser um problema. Aumentou muito de início, mas continua a aumentar embora a taxas negativas, dado que algum emprego que se cria contrabalança o índice, embora não tanto quanto se gostaria, agora mais dificultado pelo regresso de alguns emigrantes que vêm apostar, de novo, no seu país face à melhoria evidente que se verifica da economia em geral. Contudo, a passagem da 'troika' deixou alterações profundas, (potenciadas pela governação anterior que chegou ao despudor de convidar as populações a emigrar!), desde logo o caráter estrutural do desemprego. Pensou-se que seria apenas um fenómeno conjuntural, durante o período do ajustamento, mas cedo se verificou que a estruturalidade do mesmo era evidente. (Mais uma vez aconselho aos interessados a olharem com atenção para o memorando, mesmo depois de algumas das retificações introduzidas). Então chegamos a algo que não deixa de ser curioso: primeiro, o perfil do desemprego assume uma caráter estrutural; segundo, o desemprego vai caindo por efeito, sobretudo, da faixa etária entre os trinta e os quarenta anos; terceiro, o desemprego jovem continua com valores muito elevados embora com crescimento a taxas decrescentes e, quarto, o mercado de trabalho passou a contar com um novo fator, o da precariedade. Como a mobilidade passou a ser a norma, os empregadores, face à maior facilidade de despedimento, aproveitaram esta caraterística que passou a gerar um emprego mais precário e, sobretudo, com o custo do fator trabalho mais baixo. Ao se preferir os trabalhadores numa faixa etária mais elevada, vai-se aliar a experiência, embora a custo mais baixo, induzido pela tal precariedade. Quanto aos jovens, a situação ainda é mais complicada. Estes são recrutados por períodos curtos de tempo, - muitas vezes assumindo até uma certa sazonalidade -, por custos cada vez mais baixos porque estes não têm capacidade reivindicativa de espécie alguma. Com a agravante, de que esta mão de obra jovem é bastante mais qualificada do que é a geração dos seus pais. Claramente, contrata-se mais barato gente com mais qualificações. Todos conhecemos casos de jovens que arranjam emprego por uns meses, a ganharem o salário mínimo, e que são descartados ao fim de algum tempo sendo substituídos por outros, por vezes, até com valores mais baixos. Com a agravante que alguns destes jovens, para além das licenciaturas, têm mestrados e até doutoramentos. Este efeito perverso que foi introduzido no sistema dificilmente de lá sairá porque os pressupostos económicos também foram gerando uma outra realidade. O desemprego cairá, mas dificilmente atingirá os valores anteriores à crise. O chamado 'exército de reserva' que existe em todas as economias, vai continuar, mas agora bastante mais alargado o que permitirá uma maior escolha pelos empregadores mas, por outro lado, baixará o custo deste fator, fruto da maior capacidade de recrutamento e da precariedade que, sorrateiramente, vai condicionando tudo o resto. Daí que, quando olhemos para as estatísticas tenhamos sempre que ter cuidado em ler apressadamente. Quando dou formação a quadros superiores das empresas ou da banca, alerto muito para isto, e por brincadeira utilizo sempre aquela ideia de dois indivíduos sentados à mesa a comer um frango. Um come o frango o outro fica sem comer, contudo, estatisticamente, cada um comeu meio frango. Assim, é sempre de bom aviso, proceder a uma análise mais fina para chegarmos ao cerne do problema, caso contrário, podemos tirar ilações estranhas, para não dizer, mesmo aberrantes.

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