Turma Formadores Certform 66

Monday, June 11, 2018

O Grito do Profeta - "Uma história, por favor!"

Um destes dias, ia sentado no autocarro atrás de uma menina e sua mãe, que tinha ido buscá-la à escola. Como a menina não fazia questão de falar baixo e o autocarro ia silencioso, não pude deixar de ouvir a conversa... '- Mãe, logo contas-me uma história antes de eu dormir?' A mãe não respondeu, mantendo-se virada para a paisagem que via pela janela. Assim, a filha voltou a pedir, desta feita com mais delicadeza: '- Mãe, logo à noite contas-me uma história, por favor?' A jovem mãe da criança deu-lhe, então, atenção: '- Ó Ana, tu sabes que eu não tenho cabeça para te contar histórias! Ando estafada, não vês?' '- Mas era só uma história pequenina...' - tornou a Ana, fazendo uma voz irresistível. '- Tu agora até já sabes ler!' - atalhou a mãe. '- Pois, mas não é a mesma coisa' - refilou a menina. '- Ora! Quando fores passar um fim de semana a casa do teu pai, pede-lhe a ele que te conte uma história, que ele deve andar mais folgado do que eu' - replicou a mãe, já a impacientar-se. A criança ficou algum tempo calada. Por fim, voltou à carga: '- É que o pai não tem tempo. Ele chega a casa quando eu já estou a dormir...' '- Pedes-lhe que te conte a história de manhã' - sugeriu a mãe, agora mais sensibilizada. '- Oh... De manhã o pai vai logo para o computador e, além disso tem de ser à noite!' A mãe não entendeu aquela lógica e, desviando novamente o olhar da janela, interessou-se: '- Mas, afinal, tem de ser à noite porquê?' '- É que a minha professora disse que, quando ela era pequenina, o pai ou a mãe dela contavam-lhe uma história à noite e que isso a fazia sonhar!' '- Ah, já estou a perceber...' disse, então, a mãe da Ana. '- E queres sonhar com quê, posso saber?' A menina votou a ficar em silêncio. Depois, respondeu, como se falasse para si mesma: '- Eu queria sonhar que o pai e tu tinham um bebé... E eu tinha um mano pequenino...' A mãe exasperou-se: '- Mas que coisa! Então tu não sabes que o teu pai escolheu a família dele, Ana?! Não falamos tantas vezes sobre isso?!' '- Sim...' - respondeu a menina, em voz baixa, encolhendo-se no banco. '- Mas o que eu queria saber é porque é que ele não me escolheu a mim...' A conversa terminou ali. Mãe e filha saíram do autocarro poucos minutos depois. Eu fiquei a olhá-las, pela janela, solidária com a perplexidade triste da menina, cuja pergunta (cheia de sentido e legitimidade) não obteve qualquer resposta. E pensei: hoje, como ontem, ser criança deveria ser sinónimo de... ser feliz! Como seria bom se a Ana e todos os meninos e meninas do mundo não tivessem de pedir 'por favor' uma história que lhes desse o direito a serem felizes, ainda que apenas no país dos sonhos!...

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