Um anjo na noite - 2ª parte
Apanharam um táxi e lá foram avenida abaixo para a residência da loira.
Durante o trajeto não trocaram palavra. Ela ia vendo o desfilhar de edifícios,
carros e pessoas através da vidraça do banco traseiro, ele a seu lado,
continuava com aquele olhar vazio que parecia que nem se dava conta do que
estaria a acontecer. Depois de algum tempo no carro de vários quilómetros
percorridos, lá chegaram à casa dela. Era um prédio cor de tijolo muito
parecido com aqueles que se vêm em Harlem, mas não era Harlem aquele local. Era
um sítio onde nunca tinha estado. Depois de pagarem o táxi coisa que ela fez
sem perguntar fosse o que fosse, lá se dirigiram para o interior. Até aqui ele
ficou desconcertado por ela não lhe ter sugerido que pagasse. Mas enfim, afinal
era o dia de descobertas e ele queria ir até ao fim. A contrastar com o
exterior, o interior do apartamento era luxuoso. Cores suaves emergiam das
paredes onde quadros de pintores célebres se expunham aos olhares alheios. Na
sala para onde foi conduzido, foi-lhe oferecida uma bebida. Desta vez bebeu.
Estava deslumbrado e as mãos que lho ofereceram eram tão belas e delicadas que
não podia rejeitar. Pela primeira vez reparou com mais atenção na sua
interlocutora. Agora já sem aqueles agasalhos pesados para enfrentar o frio da
estação, ela aparecia em todo o seu esplendor. Corpo esbelto, pernas longas e
bem torneadas, pescoço alto encimado por um rosto belo, deslumbrante mesmo,
pensou, donde se sentia emanar uma paz que ele não tinha e que tanto almejava.
A conversa foi fluindo, sobre isto e sobre aquilo, sem rumo certo, um pouco ao
sabor da corrente. Começou a sentir-se cansado, e quase adormeceu. Foi nessa
altura que a mulher, apercebendo-se, lhe propôs irem até ao quarto. Ele estava
confuso e parecia que já nem tinha vontade própria. Não sabia se deveria
segui-la, ou simplesmente sair e ir para a sua casa. Mas ela agarrou-lhe a mão
e arrastou-o. Ele sentiu a macieza desta e o calor que transmitia. Levantou-se
e segui-a. Afinal ele já não comandava a situação. Algo ou alguém parece que se
tinha apoderado dele e lhe impunha a sua vontade. Chegados ao quarto, sempre
com aqueles tons suaves na decoração que o relaxavam, ela encaminhou-o para a
cama. Uma cama larga e espaçosa. Ele sentou-se aturdido sem saber bem o que
fazer. Se por um lado não queria estar ali, havia algo que lhe dizia para
ficar. No entretanto, a mulher foi-se despindo, lentamente, numa espécie de
striptease bem calculado. Ele foi vendo o corpo dela revelar-se como uma
aparição. Foi sentindo um desejo enorme de a possuir. E ela continuava a
despir-se muito lentamente e ele já não podia aguentar. Curiosamente, ficou a
olhar para ela, continuava sentado na cama e nem uma peça de roupa tirou. Foi
ela que, já totalmente nua, se dirigiu para ele com um largo sorriso e começou
a despi-lo. Primeiro o sobretudo pesado que envergava, depois o casaco.
Agarrou-lhe na gravata e puxou-o para si. Ele deixou-se arrastar surpreendido
pelo gesto. Peça a peça foi ficando nu também. Abraçaram-se, beijaram-se
sofregamente. Depois foi o inevitável sexo que os dois corpos ávidos já pediam.
Ela percorria-lhe o corpo como se o conhecesse há muito, ele ia desbravando
terreno no corpo que se lhe oferecia como uma revelação. Depois enlearam-se um
no outro. Não havia diálogo, apenas o sussurrar de prazer que ambos emitiam,
era o único som que se podia ouvir. Fizeram sexo uma e outra vez. O desejo
parece que nunca era saciado. E assim estiveram horas, em silêncio, onde
qualquer palavra só servia para estragar a magia do momento. Ele pensou que
foram horas, mas bem lá no fundo, nem sabia se tinham sido horas ou dias.
Aquele corpo quente e sensual a seu lado que se lhe oferecia de todas as
maneiras era algo para lá do que ele poderia esperar. Com tudo isto os
problemas que o afligiam tinham desaparecido, já nem se lembrava bem do motivo
do seu desalento horas antes. Estava simplesmente nas nuvens como nunca tinha
estado. E tudo isto se foi repetindo até que acabaria por adormecer
profundamente.
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