Turma Formadores Certform 66

Saturday, November 07, 2009

Li "Caim" e gostei


“A história dos homens é a história dos seus desentendimentos com deus, nem ele nos entende a nós , nem nós o entendemos a ele .” É assim, com este preâmbulo que começa o último livro de José Saramago, de seu nome "Caim". Muito se tem escrito e dito sobre este livro, confesso que não compreendo a polémica, tal como já o tinha dito no passado domingo Marcelo Rebelo de Sousa. Já o li e não me senti ofendido pelo que Saramago escreveu. Fui criado e educado dentro do catolicismo, que continuo a professar, e confesso que tenho muitas dúvidas sobre alguns argumentos de algumas pessoas que se sentiram ofendidas. Estou absolutamente certo que a maioria criticou sem sequer ter lido o livro. Como de costume, falam do que não conhecem, como é apanágio entre nós. Mas mesmo para alguns que o tenham lido, confesso que tenho dificuldade em perceber as críticas. Alguns dos puritanos da nossa praça, candidatos tardios a inquisidores, - ou quiseram ajudar a uma campanha publicitária, que a sê-lo, foi muito bem sucedida -, ou então, do conhecimento da Bíblia e de algum conhecimento cultural, têm uma visão muito redutora, para não dizer outra coisa. Quantos de nós, que gostamos de pensar, culturalmente enquadrados, não levantaram já algumas questões que prepassam no livro? O aceitar episódios que são verdadeiras alegorias, como episódios de contornos definitivos, só significa que por vezes o conceito religioso, mais que ditado pela Fé que cada um de nós pode professar, é ditado pela idolatria, cega, ignorante e fundamentalista, que ao longo da História acabou sempre por desaguar em conceitos distorcidos e frequentemente trágicos, que levaram à tortura e à morte muitas pessoas, como foi o caso da inquisição. Será que acham que isso é que é a verdadeira Fé? Não nego que, aqui e ali, Saramago não tenha exagerado na linguagem - ele próprio o reconheceu - mas isso não basta para atirar uma obra literária para a fogueira, como muitos potenciais inquisidores gostariam. Pessoas para quem os autos de fé de horrenda memória, seriam a purga adequada para um artista. Gente medíocre que de cultura, apenas lhe conhecem o nome, não podem ser o padrão do sentimento de muitos outros espíritos abertos, habituados aos espaços de imagens que os escritores tanto gostam de criar. Mais uma vez relembro, aqui neste espaço, o debate que existiu entre José Saramago e o Padre Carreira das Neves, este último, um especialista em estudos bíblicos. É que a grandeza destas pessoas envolvidas é tal, que reduzem todas as críticas a minudências sem significado. Na poeira da História, esses candidatos a fariseus desaparecerão, como esta, tantas vezes o demonstra; as obras de arte e os seus artífices, esses a História resgatá-los-á, porque são estes que a fazem mover no sentido da evolução da Humanidade.

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