Descansa em paz, Estrelita!
Está consumado! A Estrelita deixou-me à 1,49 desta madrugada! É com o coração sofrido que anoto a situação. É com a memória ainda demasiado fresca que a evoco. É com os olhos toldados de lágrimas que a recordo. Com o seu pêlo alvo como símbolo de pureza. Depois de alguns dias de decadência, depois duma luta tenaz pela sobrevivência, as suas funções vitais cederam. A Estrelita partiu! Dirão alguns, era apenas um cão, não se justifica tanta emoção. Mas para mim um cão é algo mais do que aquilo que aparentemente mostra. Um cão é um animal nobre que me merece mais respeito do que muitos humanos. Um cão encerra em si aquilo que de melhor o ser humano não é capaz de ter - nem todos felizmente! - mas que gostaria. A minha ligação aos animais sempre foi muito profunda. Acho que nasceu comigo e foi potenciada pela educação que tive. Já passei por situações semelhantes inúmeras vezes e nunca me habituo. Lido com estes nobres animais desde criança, mas uma perda é sempre algo de profundo que me abala até ao mais íntimo do meu ser. É como se fosse um membro da minha família que no fundo até o é. Para além de tudo isto, a Estrelita encerrava em si algo ainda mais importante e simbólico. Ela foi a cadela preferida de minha mãe. Assim, a Estrelita era como um elo de ligação - o último - que me conetava com a memória veneranda de minha mãe. Quantas vezes andou com ela ao colo, quantas vezes a afagou, "a minha branquinha" como gostava de dizer! E quando eu reproduzia os mesmos gestos, era como se ela ali estivesse, sempre presente num amor incondicional e avassalador pelos animais. A Estrelita era uma espécie de fio condutor entre mim e uma memória profunda e muito querida. Até isso se perdeu. Agora tudo se desligou, esse fio condutor partiu-se inexoravelmente. Vi-a nascer. Ela nasceu na casa onde hoje habito, duma cadela que era vítima de maus tratos diariamente por um vizinho e que a minha mãe recolheu quando se preparava para ir para o canil para ser abatida. Vinha grávida. Teve os filhotes nesta casa, e viveu com eles até à morte ainda a tempo de ser feliz. A Estrelita era a sua filha preferida, a que ela mais acarinhou até nos deixar. Hoje chegou a hora de também a sua filha nos deixar e ir-se reencontrar com a sua família de quatro patas no país do arco-íris. A Estrelita será sepultada na minha casa, no espaço reservado aos meus fiéis amigos, junto da sua mãe Patti (ao centro na foto) e da sua irmã Luca (à esquerda na foto) que foram à frente. Só ela restava desta família. Agora tudo se consumou. Sobre a sua sepultura florescerá uma bela planta, a exemplo do que acontece na sepultura de todos os outros, que perpetuará, - pelo menos é minha convicção -, o ciclo da vida. Duma existência que acaba para que outra floresça, sobre outra forma, mas sempre celebrando o grande mistério da vida. Hoje a Estelita partiu! Hoje fiquei mais pobre porque perdi mais um afeto, mais um carinho, que é apanágio dos meus fiéis amigos que vou, - talvez erradamente -, humanizando. Mas sou assim, fui sempre assim, não sei ser doutro jeito. Hoje estou triste, de coração apertado porque perdi não só uma cadela que muito gostava - e isso só por si já era mais do que suficiente - mas perdi mais ainda, perdi a ligação simbólica a um passado que determinou toda a minha vida futura. Não mais ouvirei os seus latidos que anunciavam a minha chegada a casa. Hoje estou em sofrimento. A minha querida Estrelita cansou-se da vida. Morreu acompanhada pelos que mais amou como sempre acontece com os meus cães. A minha Estrelita partiu serenamente. Descansa em paz, Estrelita!
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