A degradação gradual do Nicolau
Já assisti à degradação e ao fim de muitos animais na minha vida. Uns meus outros de ninguém. Sempre me senti desconfortável com isso. O assistir à degradação dum animal é algo que me choca muito. Neste momento estou a passar mais uma vez por isso com o Nicolau. Este belo e nobre ser vai-se degradando aos poucos. A magreza é extrema apesar de comer mais do que comia no passado. Baba-se constantemente, coisa que sempre fez, mas agora a baba vem ensanguentada com um odor fétido. Sabemos que tem a ver com os dentes, mas não só. É fruto de alguns problemas internos que vão ocorrendo ao longo do tempo. Ainda ontem a baba era branca e não tinha odor algum. Sempre que isso acontece é visível nas fezes que algo interno aconteceu. Sabemos que é assim e assim continuará. O aspeto dele é horrível. Apesar disso, e sempre senhor do seu nariz, o Nicolau não deixa que o lavemos e torna-se agressivo. Não lhe queremos colocar o açaime porque temos medo de lhe magoar a boca já de si dilacerada. Praticamente cego duma vista, o Nicolau quando vê algo que ele percebe que tem a ver com a sua higiene, logo corre escadas acima. Não sei onde vai buscar tantas forças e tino para o fazer, ele que noutras alturas quer a nossa ajuda. A incontinência é quase total, e logo nele, que sempre foi um cão tão limpo e asseado ao longo da sua já longa vida. É capaz de ir urinando ao mesmo tempo que anda sem se aperceber disso. Confesso que é muito difícil lidar com esta situação. Mas continuaremos a fazê-lo porque este nobre ser precisa muito de nós, e se não formos nós, quem o fará? O Nicolau não é um cão é um membro da família. Fazemos por ele o que faríamos por uma qualquer pessoa em estado de necessidade. Sem petulância alguma, direi até que ele tem um acompanhamento e um apoio que muitos seres humanos não encontram no fim da vida. Mas isso não evita a degradação do meu velho companheiro. Sempre colado a nós, particularmente a mim, que ele procura saber onde estou e logo se deita por perto e ali permanece pelo tempo que ali estou. Dorme cada vez mais, mas sempre com os sentidos apurados. Nada acontece cá em casa sem que ele logo levante a cabeça e tente saber o que foi. Longe da pujança doutros tempos, o Nicolau continua na sua fragilidade, a ser aquele companheiro de sempre. Anda menos e mais devagar, volta e meia cai porque já não encontra nas pernas o apoio necessário. Outras vezes, fica parado imenso tempo a olhar para uma parede ou um qualquer objeto como se estivesse a pensar em algo, ou não soubesse onde está. Mas lá continua sempre lutando pela vida. Um dia vai perder essa batalha como todos nós, mas até lá ainda é um ser que enche a nossa casa apesar das fragilidades. Força Nicolau!
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