A música de Mahler e o 'Eterno Feminino'
Falei-vos à dias de Gustav Mahler um dos meus compositores preferidos. Disse-vos então que descobri Mahler através da sua monumental 8ª Sinfonia, também conhecida pela 'Sinfonia dos Mil'. É dela que vos quero falar. Reza a estória que Mahler a compôs em oito semanas, o que é um verdadeiro prodígio para a sumptuosidade da obra. Ela está dividida em duas partes: 'Veni creator Spiritus' que não é mais do que a recriação dum hino católico medieval atribuído ao arcebispo de Mongúncia do século IX, Rabanus Maurus quando afirmou: 'Vem, Espírito Santo, inspira os nossos corações e mentes'. Dada a crise de criatividade que Mahler estava a sofrer foi este hino uma espécie de inspiração para a sua maior criação. A segunda parte foi inspirada pela parte final dos versos de Goethe, 'Fausto' - II Parte, em que Fausto tendo vendido a alma ao diabo é absolvido e resgatado pela Abençoada Virgem Maria e levado para o céu. Mahler apercebeu-se da relação entre os dois textos logo nas palavras iniciais, em que 'Veni' em latim e 'Komm' em alemão, ambos significam 'Vem'. Muitos dos fios intelectuais e emocionais da 8ª Sinfonia prendem-se com o amor platónico Cristo e o redentor 'Ewig-Weibliche' ('Eterno Feminino'). É como se estivesse a descrever os passos finais da sua extraordinariamente ambiciosa sinfonia: um hino ao amor enquanto criador e ao amor enquanto redentor. As palavras de Goethe a encerrar o 'Chrorus mysticus' são as seguintes: 'Tudo é transitório / é apenas uma alegoria; / O que é inadequado / é aqui realizado; / O indescritível / é aqui conseguido; / O Eterno Feminino / eleva-nos ao céu'. Uma obra pungente e avassaladora que me foi dado a conhecer ainda um jovem quando ia para comprar uns discos, na altura em vynil, numa discoteca do Porto, - a Melody -, cujo dono eu conhecia. Foi ele que indiferente ao meu pedido me disse para descer para a cave e ir para uma das cabines, onde dantes se ouviam os discos, e me deixou lá com esta obra de Mahler. Escusado será dizer que não comprei nada do que ia comprar, mas esta obra, na altura um duplo LP, veio comigo. Boa hora essa que me fez descobrir um dos grandes compositores do século XX de quem nunca mais me separei. Agora estou a fazer aquilo que fizeram comigo, estou a partilhar esta imensa obra que podem escutar integralmente no link https://www.youtube.com/watch?v=V-hBgoel3_A , aqui com a direção dum dos maestros mais espetaculares dos nossos dias, o venezuelano Gustavo Dudamel. Espero que gostem, pelo menos não fiquem indiferentes porque estão perante uma das maiores obras do nosso tempo. Aconselho a que se quiserem aprofundar mais esta temática consultem as memórias da sua mulher Alma Mahler, 'Memories and Letters', onde poderão encontrar mais detalhadamente informação sobre o compositor e a sua obra. Já que falo do 'Eterno Feminino' isso levar-nos-ia a falar dos Manuscritos do Mar Morto, do Evangelho apócrifo de Maria Madelena ou mesmo do de Cristo, do Languedoc, ou mais recentemente, do presidente francês François Mitterand e da sua pirâmide na entrada do Museu do Louvre onde o 'Eterno Feminino' está bem visível, logo à entrada, mas que ninguém repara. Mas isto são outras estórias que ficam para uma outra oportunidade.
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