"Judas, o obscuro" é um romance de drama e tragédia da nossa civilização. É indiscutível que o século XIX e o XX vão ambos ficar
caracterizados, literariamente, pelo predomínio quase absoluto do romance como
género literário. Ora, dentro do romance, também é fora de dúvida que a
Inglaterra não cede um passo a França na luta pela primazia mundial. Ainda
seguindo o mesmo critério de excelência, ninguém negará que, na Inglaterra,
Thomas Hardy pertence a uma categoria absolutamente ímpar, junto com Dickens,
Meredith, Falsworthy, Lawrence e alguns poucos outros. E com mais certeza ainda
se poderá afirmar que, na obra de Thomas Hardy, nenhum romance pode disputar a
primazia a “
Judas, o Obscuro”. Resulta, portanto, de tudo isso,
que este romance é, inegavelmente, uma das maiores obras-primas que a humanidade
possui e um dos livros que mais fielmente podem refletir o drama ou a tragédia
que a nossa civilização vive. Toda a problemática do homem moderno, na sua vida
íntima, aí está refletida, graças à extraordinária sensibilidade e ao
excepcional poder criador de perfeitas incarnações do homem sensível e delicado,
bom e puro, que a máquina impiedosa das convenções sociais e dos egoísmos
individuais não hesita em esmagar, sem nem sequer desconfiar da desgraça que
está ocasionando. Mas, que pode ele fazer senão ser ele mesmo? E pode ela fazer
senão ser ela mesma? Judas não só não conseguirá construir o seu futuro,
realizar os sonhos de infância, como nada poderá fazer contra o seu destino de
perseguido e de eterno ignorado. Desconhecido, incompreendido, enganado, só
poderá responder aos golpes da vida com a pureza do seu gesto, tantas vezes
repetido, de desvendar inutilmente aos olhos de todos o seu coração de homem. Os
que o rodeiam viram então a face, porque suas feridas ferem a eles próprios. Não
o compreende, na cegueira dos seus pequenos preconceitos de mulher
conscientemente inteligente demais para o seu meio, a criatura que ama e amará a
vida interia acima de todas as coisas. E a outra é só mentiras e engodo. Uma e
outra dele só se aproximarão para reforçar, de um dos modos mais trágicos a que
já nos foi dado assistir, o grito lancinante do poeta contra a mulher: “Tu n’es
jamais la soeur de charité, jamais!”. Por outro lado, o que torna ainda
maior e mais classicamente trágico “
Judas, o Obscuro” é que essa
verdadeira biografia de um fracassado foi escrita por um dos homens que mais
profunda e mais delicada, mais piedosamente, souberam se inclinar sobre o
sofrimento humano. Poucos livros serão mais tristes – amargo, nas suas páginas
finais, como poucos livros terão sido amargos. Poucos possuem, em tão alto grau,
o sentido da tragédia humana, no que ela tem de mais absolutamente insolúvel e
eterno. Acompanhando Judas, passo a passo, no seu terrível calvário, é o próprio
homem que Thomas Hardy acompanha. É o Absoluto que se atinge, através dessa
experiência de homem, e de homem em luta com as realidades sociais da sua época.
E é por isso que o valor da obra me parece inexcedível, como inexcedível é a sua
importância para a nossa experiência individual. A todos os títulos recomendável.
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