Turma Formadores Certform 66

Friday, November 02, 2012

Equivocos da democracia portuguesa - 217

Terminou a discussão na generalidade do OE 2013 com o fim anunciado, isto é, com a aprovação dos partidos da maioria, com uma única exceção de um deputado do CDS/PP da Madeira. Todos os outros votaram contra. Assitimos, desde à vários anos, à discussão deste tipo de documentos - documento essencial para o exercício do Estado no ano seguinte - e nunca vimos nada como o que aconteceu com este. Durante um dia e meio discutiu-se não o OE 2013, mas sim, tudo aquilo que de periférico nele estava consubstanciado. E isto aconteceu porque ninguém acredita nele e na sua exequibilidade, mesmo alguns daqueles que o votaram favoravelmente. Mas o que mais atraiu as atenções nesta discussão, sobretudo no primeiro dia, foi o tão falado e tão nebuloso plano B e um possível segundo resgate. Quanto ao primeiro, já sobre ele tecemos algumas considerações em escritos anteriores. Foi algo que foi imposto pela "troika" face ao não cumprimento das metas acordadas e, também eles, acharem que a possibilidade de um novo deslize com este OE será algo de possível, daí o quererem garantir que estão salvaguardados. Isto vem colocar, desde logo, a questão da desconfiança da "troika" sobre o governo português e a sua capacidade de controlar a situação. Quanto à possibilidade dum segundo resgate, foi uma ideia que se começou a prefilar ainda antes da discussão do OE, com algumas afirmações oriundas do PM. Como já negociou ajustamentos nas costas dos portugueses e da AR, tal não será uma hipótese a excluir. Este orçamento é o mais restritivo que jamais foi apresentado em democracia. Ficamos com a ideia, quer do que nele se afirma, mas também, de algumas afirmações de alguns deputados e membros do governo, de que a ideia maior é uma alteração de paradigma da sociedade portuguesa, dentro duma visão ultraliberal que é a deste governo, consubstanciando a destruição ou a redução ao mínimo, que vem dar quase no mesmo, do estado social. (Agora confirmado pelas declarações de Marques Mendes sobre a matéria, negada pelo gabinete do PM, mas confirmada pelo ministério das finanças de que o FMI já está a estudar o assunto em Lisboa à cerca duma semana!!!). Sabemos que o estado social que temos dificilmente seria financiado no futuro sem que houvesse mais rigor e até alguma contenção, mas a visão que o governo apresentou é mesmo o da sua destruição, dando a concessão ao setor privado. E isso parece-nos errado, porque a matriz social é a matriz da verdadeira UE, embora hoje, tal como Portugal, esta esteja mergulhada na escuridão ultraliberal que a varre. Quem sai beneficiado de tudo isto é seguramente o setor privado e essencialmente a banca. (Vejam-se as afirmações de Ulrich à dias sobre a austeridade!) E sai-o por duas vias, a saber, pelo financiamento desta a juro próximo dos 0,5% junto do BCE para depois comprar dívida portuguesa impondo um juro de 4,5% a 5%. Isto é agiotagem pura, pensamos que ninguém terá dúvidas sobre isso. E tal assume ainda mais relevância quando a dívida pública ser uma consequência e não uma causa porque o verdadeiro problema é a dívida privada. Assim, os portuguesas contribuem para o pagamento do serviço da dívida - porque ainda não abatemos a dívida mas estamos a pagar os juros! - dos credores internacionais, e ainda, contribuem para o setor privado - leia-se a banca - que detém uma parte dessa dívida do Estado. Esta é a verdadeira realidade que não pode ser escamoteada. Por isso, as hostes democrata-cristãs engoliram um sapo colossal para aprovar o orçamento, embora o voto contra do deputado da Madeira possa dar um sinal de embaraço que não pode ser ignorado. Assim, embora ainda haja a discussão na especialidade, não pensamos que este venha a sofrer alterações substanciais desde logo impedidas por Vítor Gaspar que o defende como a sua jóia da coroa. Isto significa que Portugal estará debaixo duma forte recessão e dum empobrecimento profundo de todos, em especial, da classe média que, verdadeiramente, tem sido chamada à pedra em todo este processo. E perguntamos: Se todo este esforço tem por objetivo diminuir o défice de 5 para 4,5%, isto é 0,5% pontos percentuais, o que será quando em 2014 tivermos que o colocar nos 2%? E já agora uma outra singela pergunta: Porque é que nos obrigam a atingir em 2014 os 2%, quando todos os outros países se fixam nos 3%? Porque será esta exceção? Que existe mais que ainda não nos foi revelado? Não queremos ser tão maquiavélicos assim, mas ficamos cada vez mais - e não somos os únicos - com a sensação que este governo pretende destruir todo o edifício do estado social para sobre as suas cinzas edificar algo que ainda parece nebuloso. Indo até ao ponto de condicionar governações futuras, com outra ideologia, porque já não terá espaço para recuar. E a ser assim, o caso torna-se ainda mais grave e digno duma reflexão profunda.

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