Um país a apodrecer
Desde há muito que a degradação da vida em Portugal se vem tornando quase asfixiante. E não me refiro apenas à degradação do nível de vida de todos nós, que um grupo de "iluminados" rapazes encetou na senda dum qualquer cavaleiro andante medieval de triste figura. A punição por termos vivido melhor, merece o castigo destes cavaleiros do Graal, sempre prontos a punir, a estigmatizar, a apontar, pensado eles que são o modelo de virtudes. Enfim, gente impreparada para estas coisas do poder, que o acaso colocou nessa vereda que tão caro nos tem saído. Sempre prontos a acender as fogueiras num qualquer auto de fé, a mando duma qualquer "sagrada" inquisição. Duma presidência distante do povo, uma espécie de monarquia onde alguns que fazem parte da corte do rei, ainda questionam o povo esfomeado e perguntam: "Porque não comem 'croissants'?". Mas este país, para além de governantes deste jaez, - e como uma desgraça nunca vem só -, tem vindo a apodrecer, qual maçã bichosa que vai sendo corroída por dentro até nada mais dela se aproveitar. A política entrou num caminho de degradação que nunca pensei ver por terras lusas, a justiça anda sempre adiada para os poderosos e célere para os miseráveis, a educação anda corroída até à medula, seja por professores, que de tão nobre profissão apenas lhes conhecem o nome, seja dum ministério que acha que esta deve ser cada vez mais privada, logo acessível apenas aos de mais posses, como acontecia nos meus tempo de menino e moço, onde apenas aqueles que tinham dinheiro almejavam chegar a uma universidade. A saúde está cada vez mais desqualificada, o Serviço Nacional de Saúde que já foi modelo para o mundo, está depauperado, a qualidade do serviço é cada vez menor, mas lá estão os privados para suprir as carências daqueles que têm posses para isso. Mesmo a finança anda a arrostar-se pela lama. Instituições prestigiadas agora aparecem como um puro covil de malfeitores, onde já ninguém consegue acreditar. A Bolsa que era um espaço de negócio importante neste modelo capitalista em que vivemos, parece também ela já não escapar a esta sina. Veja-se o que aconteceu com esta incrível pontaria da PT para retirar tudo o que tinha entrado no BES pouco antes da bomba explodir. Veja-se a suspensão das operações a descoberto do BCP hoje mesmo. Veja-se o regulador que diz que está tudo bem para dias depois se verificar que afinal nada vai bem. Neste país corrompido, apodrecido, é caso para nos interrogarmos, afinal que fazer? Afinal em quê, e em quem confiar? Não sei se esta é a crise duma sociedade capitalista que está incapaz de se renovar, neste ciclo infernal de crise e retoma, onde haveria o dia em que não fosse capaz de continuar como afirmava Keynes. Talvez seja um pouco de tudo e de nada porque nestas coisas nunca se sabe onde está a razão ou a estultícia, onde existe a verdade ou espreita a mentira, onde os valores da seriedade já são coisa fora de moda, dum outro tempo. Sejam quem forem os autores, mais cultos ou menos instruídos, parece que entramos numa espiral de terrível confronto entre a sagacidade e a vilania, a mentira e a verdade, a seriedade ou o deboche. Só que entre nós, estes fatores mais negativos parecem que são os que acabam por levar a melhor. Numa democracia ainda jovem, (apesar dos seus quarenta anos), fica-se com a sensação de que já nada vale a pena. Viver cada dia como se fosse o último parece ser o novo léxico que nos pretendem inculcar. Os valores da solidariedade, da seriedade, do aprumo, que foram os meus na minha meninice são cada vez mais espúrios que se olham como se de algo estranho se tratasse. Num mar de expectativas, que a liberdade reconquistada e a democracia consolidada, - valores que emergiam perante os olhos de todos nós -, tudo virou um mar de tormenta, tempestuoso, aziago, onde apenas os mais audazes, sem escrúpulos, sem lei, são os verdadeiros sobreviventes, mesmo que tenham que atirar ao mar os que estão a mais no bote. Todos vamos assistindo a isto, dia após dia, com o sentimento duma impotência que dói, onde já não há lugar para quem quer fazer da vida um paradigma de seriedade. Mas o mais grave, é que parece que nos vamos habituando a isto, fazemos até parte disto, e começamos a olhar de viés aqueles que defendem um retorno à seriedade. Afinal, não é só o país que está apodrecido, não é só o regime que está caduco, não são só as instituições que estão a feder. Não, agora é mais grave. É a nossa própria personalidade, mentalidade, que vai aceitando tudo isto como natural, assim apodrecendo aquilo que ainda seria um pilar de esperança no futuro, - nós mesmos. Um país onde não se sabe quem é responsável e a quem responsabilizar. Um país de sombras, onde esse jogo terrível de espelhos parece ser o desígnio nacional. Este não é um país, é uma mentira. Não sei se depois da crise vem de novo a retoma, - não aquela que a propaganda governamental vomita todos os dias nos "media" numa narrativa de embuste desmedido -, mas a verdadeira retoma que dê dignidade à vida dum povo. Mas confesso que já não estou preocupado com isso. Afinal como dizia Keynes: "No médio/longo prazo estamos todos mortos".
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