Com a verdade nos enganam
A polémica em torno da Grécia e do seu novo governo parece não ter fim. Até se compreende. Uns, porque pretendem continuar a humilhar esse povo, o mesmo povo que nos deu a Democracia; outros, porque se sentem incomodados pela submissão de "cachorro abandonado" que têm tido perante as instituições, ou melhor dizendo, perante a Alemanha. Um dia, com o devido distanciamento histórico, se fará a análise deste período negro da Europa, e então, veremos o que haverá para dizer. Mas para aqueles que, entre nós, tanto têm falado contra a Grécia, não percebendo a humilhação que fazem aos portugueses quando tomam certas atitudes, será bom lembrar que a grande nação helvética tem uma dívida externa inferior à nossa, isto é, dependem menos do exterior do que nós! Quem diria!... (Já agora, cumpre esclarecer que a dívida externa inferior à portuguesa significa que a Grécia tem menos dívida pública e mais dívida privada, daí a sua menor exposição ao exterior). Mas se olharmos para o saldo primário - em contas do Estado é o saldo dos recebimentos e pagamentos tirando os juros da dívida - é mais excedentário que em Portugal. Significa que, apesar da tremenda austeridade que tem sofrido a Grécia, esse saldo ainda é melhor do que o nosso. Contudo, isto não significa que seja bom para a Grécia porque isso quer dizer que tem mais impostos que nós, teve uma quebra nos salários maior do que a nossa e quebras nas pensões bem mais significativas. Por isso, Varoufakis diz que o saldo primário não deveria ser tão grande. Isto quer dizer também que existe uma folga para o ajustamento, e é precisamente aqui que o governo de Tsipras está a tentar atuar para além doutros setores. Por aqui parece ter começado o governo grego a ajustar a economia. Mas o que me parece mais significativo de tudo isto é que quando comparamos Portugal à Grécia, afinal não estamos tão melhor assim, contrariando uma narrativa (para usar o termo da moda) que os políticos vêm desfiando. Quando se diz que Portugal nada tem a ver com a Grécia é uma tremenda mentira. Percebo o porquê da afirmação, e numa análise mais superficial até é assim. Mas quando começamos a ir mais fundo as surpresas são evidentes. como atrás ficou claro. E as recentes afirmações ontem proferidas pela União Europeia (UE), de que pretende vigiar de perto o que se passa em Portugal são bem disso exemplo. Porque o nosso país tem "desequilíbrios macroeconómicos excessivos" (Moscovici) - desde logo o alto desemprego e o fraco crescimento económico, mas também, pela sua elevada dívida pública - que leva a que a UE queira manter a rédea curta. É preciso não esquecer que Portugal tem a terceira dívida mais elevada na Europa! O que pode parecer estranho quando se vê diariamente um tremendo foguetório em torno de oscilações de décimas que são residuais na economia nacional. E já agora, é bom lembrar que a França conseguiu mais dois anos para ter o défice abaixo dos 3%! Afinal, parece que a teoria do "bom aluno", do macaquinho circense devidamente amestrado que Schäuble apresenta, não passa duma mentira. O silêncio de ontem do primeiro-ministro português quando confrontado com isto, mostra bem a surpresa e o incómodo. Afinal, e parafraseando o discurso dominante, não somos a Grécia, mas estamos também longe de ser a Irlanda.
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