Memórias natalícias - IV
Resolvi partilhar uma pequena estória com o presépio que hoje vos trago. Este é bastante mais recente. Era eu então um jovem estudante do ensino preparatório (tinha 10 anos nesta altura) quando nas aulas de trabalhos manuais - como então se chamavam - foi-nos dado um tema para fazer uma peça para o Natal. Era um presépio o objeto do tema. (Quero aqui confessar a minha incapacidade de fazer algo com as mãos. Já nessa época, era visível que o intelecto seria a opção clara da minha vida). Mas, tal como os outros alunos, tinha que fazer o tal presépio. Como fazer? Era a pergunta mais óbvio e que me trazia angustiado. Falei em casa sobre o assunto, e logo a minha mãe me tentou ajudar, indo buscar inspiração para as figuras que compõem o mesmo, num postal natalício que por lá tinha chegado. Foi ela que desenhou as figuras embora no desenho eu me desembaraçasse bem. Mas o pior estava para vir. Era transformar aquilo em peças. Eu bem que levei os desenhos para a escola, lá os foi desenhando em madeira, mas o passo seguinte estava a ser de difícil desfecho para não dizer mesmo... trágico! Sem que ninguém se apercebesse, lá fui trazendo para casa aquilo que fazia na escola, (sempre às escondidas porque não era permitido fazê-lo), e de cada vez que os trazia, o meu avô materno e padrinho deitava as mãos à cabeça. Sempre com aquele sentido de me ajudar que sempre teve até ao fim dos seus dias, o meu avô lá me ia ajudando, ou melhor, era ele que ia fazendo, à que dizer a verdade. Não tão perfeito quanto ele gostaria, mas sempre tendo em conta que dada a minha falta de habilidade para tais tarefas, seria difícil apresentar na escola algo que seria logo detetado como não sendo feito por mim. Um belo dia lá foi buscar umas placas de cortiça que existiam num campo perto da casa onde então vivia, para a gruta. Já tinha, entretanto, feito um estrado a preceito. Depois foi a manjedoura e as restantes peças, numa disposição idêntica ao do famoso postal donde tinham sido retiradas. (Quero aqui assinalar, porque não é bem visível na foto, que até palha na manjedoura existe, cozida com uma linha para não se soltar. A que está lá é original e lá permanece à cinco décadas). E assim lá cumpri a tarefa escolar, sem que alguns alunos dissessem que não era da minha autoria. O que até era verdade, mas que me deixava irritado. Afinal alunos queixinhas sempre existiram. Essa peça no fim do ano letivo veio para casa e ainda no verso se identifica o número que tinha na escola, o 18, e a turma, a 4ª turma do 2º ano. (O equivalente ao atual 6º ano). E aqui fica mais uma estória dum Natal já com muitos anos passados. Esta peça continua a ser exposta no Natal em minha casa como símbolo do sacrifício dum aluno desajeitado, mas também, como a homenagem a quem tornou possível a superação da dificuldade com que me deparei nesse tempo.
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