Turma Formadores Certform 66

Wednesday, July 13, 2011

Equivocos da democracia portuguesa - 122

Agora o contágio está a chegar à Itália, que é a terceira economia da zona euro. Entretanto, a Moody's - de novo - atira a Irlanda para o "lixo". Não que tal facto seja surpreendente de todo, visto a maneira tardia como a UE está a reagir e as hesitações que continua a demonstrar apesar de tudo. As divisões internas, a falta de clareza na acção, tem sido um dos obstáculos ao bom desenvolvimento do processo, como viria a ser reconhecido por Durão Barroso em entrevista à RTP1. Quanto aos investidores tentam salvar o que podem enquanto podem e se dúvidas houvesse é só olhar para o comportamento das bolsas europeias e a nossa não foi excepção. Contudo, é preciso não esquecer que a Itália tem a segunda maior dívida pública a seguir à Grécia. Mas agora, parece que a UE está a entrar numa espécie de frenesim, numa histeria que, para além de ser inconsequente nada vai resolver, enquanto não se puserem de acordo os diversos países e, para isso, será preciso fazer o mais difícil, colocarem de lado os seus diversos interesses individuais. Jean-Claude Juncker vem agora dizer que os privados têm que participar na segunda ajuda à Grécia, medida com a qual a Espanha não concorda, embora talvez devesse rever a sua posição porque quando a crise do imobiliário chegar a este país e atingir os bancos espanhóis, a Espanha estará em grandes dificuldades e, talvez aí, mude de opinião quanto à ajuda. E se a Itália entrar em dificuldades, como parece fazer crer, a Espanha virá a seguir. Assim, temos que ser frios na análise e dizer que, o problema não são só as agências de "rating", porque para além das classificações arbitrárias que mais servem os interesses dos seus investidores do que os países, não se tem sido capaz de demonstrar o contrário do que elas dizem. Esta afirmação, mais ou menos nos mesmos termos, foi produzida à dias por Vítor Bento, o reputado economista, que fez uma análise desapaixonada do que se está a passar, e já objecto do nosso comentário em crónica anterior. E agora, "in extremis", a UE vem apelar ao controlo das agências de notação financeira, à proibição da avaliação de "rating" aos países com ajuda financeira, num coro desconexo e inconsequente que temos dúvidas em acreditar que dê algum fruto. A solução, em nosso entender, passa pela criação das "eurobonds", de que tanto se fala, que permitam trocar estas por dívida dos países, apoiada pelo Fundo Europeu. Por cá, discutia-se num passado recente, os juros a 10%, quando eles agora já estão acima dos 20% para empréstimos a três anos. O que significa que a crise da dívida soberana se agravou duma maneira evidente e agora, aqueles que criticavam o anterior executivo, como se os males do mundo dele derivassem, pretendem varrer para debaixo do tapete estas verdades inconvenientes, senão mesmo, desvalorizá-las. Não vá, aqui também, haver algum fenómeno de contágio. Será curioso notar que os mesmos que dizem que embora com a classificação de "lixo" ainda estamos a meio da tabela, são os mesmos que no passado recente quando havia um abaixamento do "rating" - embora ainda muito acima de "lixo" - já teciam fortes críticas sobre a governação. Mais uma vez, dois pesos e duas medidas. Para além disso, cada vez mais se houve falar na reestruturação da dívida, que outros quadrantes defendem desde à muito, e que cada vez mais assume contornos de inevitabilidade. Como dissemos em tempo útil, o próprio histórico da dívida indicia que isso tem que ser equacionado, caso contrário, Portugal não será capaz de assumir os seus compromissos, mas primeiro achamos que temos que fazer algum trabalho de casa, arrumar o que deve ser arrumado, e dar a ideia de que estamos no bom caminho. Porque a reestruturação da dívida pode ter, ela própria, efeitos adversos e perversos, como está a acontecer com a Grécia, que viu a sua dívida reestruturada, mas que não fez o seu trabalho de casa convenientemente, logo vendo agravado o seu "rating" pela Standard & Poor's que admite que o alargar os prazos por mais três anos é equivalente à bancarrota. E convenhamos, que na situação da Grécia até tem a sua lógica. Qualquer investidor pensaria o mesmo, para além da notação da agência norte-americana. Quanto a nós, temos que repensar bem a nossa maneira de estar no mundo porque, se olharmos para a nossa já longa História, vemos que Portugal cresceu sempre à custa da dívida, isto é, cresceu sempre à custa dos empréstimos que obtinha. Até o padre António Vieira - em pleno século XVI - faz nota disso no seu célebre "Sermão de S. António aos peixes". Ele que para além de eclesisástico foi também diplomata e se viu envolvido em idêntica situação na época, com os fundos que obtinhamos junto da nossa aliada Inglaterra. Há quem pense que será sempre assim, nós achamos que nada é definitivo na História e pode ser alterado para melhor. E para isso, à que começar a racionalizar a despesa do Estado, já que a receita começa a dar sinais de esgotamento, e acabar com algumas instituições e cargos que em nada acrescentam à máquina do Estado, apenas acrescentam despesa. Veja-se o que aconteceu no passado fim-de-semana com o congresso dos autarcas, onde os "boys" de váris tendências não querem perder os "jobs" que lhes foram prodigamente distribuídos. "No jobs for the boys" foi o lema de António Guterres que arrasou literalmente Fernando Nogueira, depois do PSD ter inundado a função pública com partidários seus. Porque nesta questão, não existem inocentes, todos contribuiram para a situação que se verifica. Mais uma vez nos vem à memória uma frase do padre António Vieira quando afirmava aos peixes "há aqueles que se comem uns aos outros e cada vez em maior número, mas não olhem para vocês próprios peixes, olhem para a cidade onde isto é visível todos os dias". Muitos séculos depois a história repete-se, tal como a dívida crónica, tal como o crescer assimétrico baseado na mesma dívida. Muito tempo passou mas parece que foi ontem, afinal, tal como o mau aluno, ainda não fomos capazes de perceber que este não é o caminho e, que quando trilhado, pode levar a consequências desastrosas como aquelas que estamos a viver nos nossos dias. Quase que nos apetece dizer como José Régio no seu "Cântico Negro": "Não sei onde estou, não sei para onde vou, mas sei que não vou por aí".

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