Tempos de hipocrisia
Temos sido surpreendidos com as notícias que vêm do Médio Oriente, especialmente do Egito e da Síria. Culturas milenares que se imolam no altar do poder efémero, em guerras fratricidas, com imagens pungentes que nos entram pela casa adentro. Mas ontem, teve particular relevo aquelas que tiveram origem na Síria. Delas se falava e comentava que o governo sírio tinha utilizado gás tóxico para destruir o seu povo. As imagens mostravam muitas pessoas, especialmente crianças, que sufocavam ou que até já estariam mortas pelo efeito do tal gás. A UE veio dizer que era inaceitável, os EUA que não podia ser permitido e até a ONU achava que tal não fazia parte daquilo a que se usa chamar de "guerra limpa"! Como se houvessem guerras limpas e menos limpas. Guerras são guerras. Todas têm os seus cortejos de horrores onde as crianças e as mulheres são o alvo principal. Não há nobreza na guerra porque ela é bestialidade, sejam quais forem os tempos, sejam quais forem as motivações. Seja a brutalidade de Afonso Henriques que recorria ao empalamento dos seus prisioneiros sarracenos para desmoralizar os exércitos inimigos, sejam as atrocidades de Hitler, sejam a morte com gases - aqui também - no Iraque ou a homofobia do Irão. As guerras não são limpas. Nunca são limpas. E normalmente quem sofre as consequência não são os senhores que as fazem, mas as populações que, normalmente, nada têm a ver com estas questões, que se vêm no epicentro das atrocidades. Como se pode dizer que é cruel e desumano a utilização de armas químicas quando elas têm vindo a ser utilizadas desde há muitos anos? O seu uso maciço teve lugar logo na I Guerra Mundial, depois nas câmaras de gás da II Guerra Mundial, e desde aí, nunca mais se parou! Mas se é cruel morrer com gás, não o será também com um tiro, na guilhotina ou na terrível bestialidade dum empalamento? E que dizer daqueles que usaram a descoberta da desfragmentação do átomo para produzirem Hiroshima e Nagasaki? Os EUA que acham inadmissível o seu uso na Síria, não o utilizam também nas suas guerras hegemónicas? Não as utilizaram quando queimaram um país chamado Vietname? Não as utilizam hoje em dia? Afinal que moral é esta de guerras limpas e sujas? Quando se fala de guerra nunca se pode falar de serem limpas ou não, como as mãos de quem as provoca também não estão limpas. As mesmas mãos que vendem esses armamentos para ajudar a sua indústria que as confeciona. A hipocrisia é hoje em dia também uma arma de propaganda que esconde muita da sujidade que a mente humana é capaz de produzir. Quando se produziram armas químicas já as mentes que as conseguiram criar estavam toldadas pela sujidade da guerra onde seriam usadas porque não são só as pessoas que sofrem com elas, mas também os animais indefesos que nem percebem o que lhes está a suceder, como a natureza quando sofre com armas de desfolhamento para tornar o campo de batalha mais limpo como foi o caso do Vietname e do Cambodja. Já para não falar no napalm que foi usado nessas paragens ou até nas nossas antigas colónias. Normalmente quem vem agora com a hipocrisia estampada no rosto falar do tema são aqueles que pior uso deram a tais armas e as suas palavras apenas escondem a lama que sai das suas bocas. Nem sequer servem para exorcizar consciências porque simplesmente já nem as têm.
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