À volta do Orçamento de Estado 2020
Esta pretende ser uma primeira abordagem a um documento complexo e extenso como é o Orçamento de Estado (OE) que só à dois dias foi conhecido. Coisa que tenho que fazer para outras instituições como é habitual ano após anos. Mas trata-se apenas dum esboço do muito que há para dizer a quando da versão final do documento. Mas numa primeira abordagem há coisas que merecem ser clarificadas. Sou um grande admirador do Professor Mário Centeno o que não quer dizer que concorde com tudo o que ele defende. Desde logo aquela ideia que não há aumento da carga fiscal. Esta é uma daquelas asserções que carecem de fundamento. Basta olhar para o impacto das alteração dos escalões de IRS para se perceber que não será tanto assim. Haverá pessoas que por este efeito logo passarão a pagar mais, disso não existem dúvidas. Já para não falar nos impostos indiretos a que nenhum de nós pode escapar embora, por vezes, sem darmos por isso. Outra questão prende-se com o superavit orçamental coisa que nunca aconteceu desde o início da nossa democracia. Confesso que como economista me sinto dividido sobre o tema. Se por um lado, fique satisfeito por ver Portugal com superavit orçamental, - muito na linha dos países do norte -, também tenho que considerar que esse pode ser um engulho para economias pequenas, frágeis, muito dependestes do exterior e sobretudo muito abertas como é a portuguesa. Se por um lado tal fica bem para apresentar em Bruxelas, temos que considerar que os mecanismos de ajuste e o impacto de tal atitude é bem diferente entre nós do que seria num dos países mais ricos do norte. Estamos a falar de realidades bem diferentes cuja comparação é sempre difícil por mais efeitos que lhe queiramos dar. (Penso que o ministro das Finanças quer passar à História como o ministro do superavit dado o empenho que tem em obtê-lo, a que não será alheia a sua posição de presidente do Eurogrupo. Coisa que até compreendo). Acresce ainda que tal não está inscrito em nenhum tratado da União Europeia (UE), como tal, o dizer-se que será o caminho certo em relação às normas de UE, também aqui, carece de fundamento. Se calhar este excedente poderia ser encaminhado para o investimento público tão depauperado, que teria o efeito de alavancagem da economia como um todo e no emprego também, bastando para isso ter um pequeno défice que ninguém de boa fé levaria a mal. Mais do que o défice penso que é na dívida pública que o problema assume maior dificuldade. Temos uma elevada dívida que é um fator de constrangimento do país e, apesar da grande amortização que foi feita nos últimos quatro anos, ainda assim é muito elevada e deve, diria mais, tem de ser abatida a um ritmo mais rápido do que aquele que tem acontecido. Penso que é aqui que a governação deve estar mais atenta, - e estará seguramente -, porque este é um problema que pesa e muito sobre o país. Mas nem tudo é mau. Um OE tem, como é óbvio, coisas boas e outras nem por isso, e este não é exceção. O investimento na saúde já anunciado a algum tempo é uma atitude correta, com uma dotação que não é coisa pouca, o que deve deixar mais tranquilo e equilibrado este setor fundamental. Mas outros também não poderão ficar esquecidos, e não o estão de todos, como o investimento na educação tão carenciada também, bem como nas forças de segurança. Naturalmente que um OE é um exercício de equilíbrios nem sempre fácil. Também sei que vamos ter que ir mostrando recuperação face à UE. Mas também sei que é necessário buscar pontes de consenso que nem sempre, para não dizer nunca, são fáceis. Esta pretende ser apenas e só um primeira abordagem - desprovida da língua técnica sempre de difícil entendimento para o público em geral - duma peça muito complexa que só agora conheceu a luz do dia. Mas achei necessário esclarecer alguns pontos face a um certo ruído que a política e os políticos tanto gostam. (Foi sempre assim, mesmo no anterior regime. Basta olhar para os famosos 'Planos de Fomento' de então e ver a sua execução para não termos dúvidas disso). Contudo, estou certo que ainda algumas coisas mudarão em sede de especialidade. Ainda muita água vai correr sob as pontes até termos a versão definitiva do texto. O processo do OE é longo e só estará concluído lá para meados de Fevereiro de 2020. Ainda haverá muito tempo para discussões e ajustes que esperemos sirvam para o tornar uma peça mais interessantes para os portugueses.
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