O ponto final de Saramago
Hoje prestou-se a última homenagem ao maior escritor português deste século e único Prémio Nobel da Literatura, José Saramago. Depois do elogio feito pelos Reis de Espanha e pelo executivo do país vizinho, que se fez representar no funeral pela sua vice-presidente Maria Teresa de la Vega, enquanto que em Portugal foi notada a ausência do Presidente da República. Envolvido em querelas passadas, Cavaco Silva foi incapaz de distinguir o homem político do grande intelectual que tanto enobreceu a língua portuguesa. O PR ainda não foi capaz de perceber que representa uma nação, um povo, e não só a sua pessoa. Cavaco Silva não percebe que os políticos estão sempre de passagem, - apenas ficam na memória aqueles que se notabilizam -, o que não é o caso do actual presidente. Ele (Saramago) perdoou ao seu país que tão mal o tratou, querendo que as suas cinzas permanecessem em Portugal. Saramago ficará na História, ele apenas nos arquivos. Quando o tempo tiver devorado a memória da "banalidade" - expressão de Saramago - ele ficará ao lado dos grandes nomes da cultura portuguesa, ao lado daqueles a quem Camões disse "que se vão da lei da morte libertando". Mas o insólito não ficou só por aqui. O Vaticano, representante maior do catolicismo, apesar da maneira diplomática como a Igreja portuguesa tinha ultrapassado a querela, veio incendiar os ânimos com um editorial no jornal oficial, L'Osservatore Romano, num artigo assinado por Claudio Toscani muito pouco digno, sobretudo, para aqueles que têm no perdão a sua motivação maior. Afinal a Igreja continua com dificuldade em se adaptar ao novos tempos - estamos no século XXI - dando sinais de intolerância donde menos se esperava. Depois dizem que não percebem a crise de vocações, bem como, as igrejas com cada vez menos fiéis. Também por lá não se percebeu que a arte e os credos nem sempre são compatíveis. Se assim fosse, ainda hoje andávamos a dizer que o sol é que se movia em torno da terra. Mas para além destas minudências, essas coisas menores que por vezes nos distraem das essenciais, face à personalidade que hoje prestávamos homenagem, fica a grande movimentação popular, os "levantados do chão", as pessoas simples, os anónimos, que não quiseram deixar de homenagear este vulto imenso da nossa cultura. Vejam o que Espanha lhe fez de homenagem pública, ao mais alto nível, e a maneira como se fez representar. Portugal continua a deixar aos outros o reconhecimento dos seus maiores, que deveriam ter do seu país um tratamento bem diferente. Mas, Saramago esse homem do povo, amparado pelo seu (sua) Pilar (del Río), deu voz aos "Levantados do Chão", viajou numa "Jangada de Pedra" e elaborou um "Memorial (do Convento)" que o projectará para a Humanidade e para a Eternidade. Como dizia o escritor Nuno Júdice "não há palavras porque Saramago levou-as todas". No dizer de Pessoa, outro que só foi reconhecido por cá depois do Brasil o ter descoberto, "Se depois de eu morrer, quiserem escrever a minha biografia, não há nada mais simples. Tem só duas datas - a da minha nascença e a da minha morte. Entre uma e outra todos os dias são meus". Obrigado Saramago. RIP.
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