Equivocos da democracia portuguesa - 66
Neste últimos dias, continuamos a assistir a ataques e contra-ataques entre os candidatos presidenciais. É normal em democracia, que cada um defenda as suas posições, por vezes, acaloradamente, mas que isso signifique ignorar os problemas que a todos aflige, vai uma grande distância. Talvez por isso, é que as audiências e o acompanhamento da campanha eleitoral, atinge os mais baixos índices de sempre. As pessoas estão muito preocupadas com a situação em que vivem e não estão dispostas para "aturar" arrufos entre candidatos que se recusam, sistematicamente, a falar dos problemas reais do dia-a-dia. Que Portugal não está bem, todos o sabemos, mas o que muitos não sabem é que Portugal nunca esteve bem, ao longo da sua História, embora os sucessivos políticos tenham dado a entender o contrário. Já nos anos 30, em pleno Estado Novo, as coisas não corriam de feição. Portugal esteve numa situação de bancarrota eminente, o que levaria os políticos do regime, e as associações empresariais - tuteladas por esse mesmo regime -, a motivarem as populações para a poupança, alertar para o despesismo e, até, a consumir os produtos nacionais! Mas dê-mos voz àquilo que então se escrevia. Em editorial da Indústria Portuguesa, o presidente da AIP declarava que "por cada mil contos de produtos manufacturados que se importam num país, mandam-se para o desemprego cem pessoas". E concluia, "Combatei o desemprego consumindo produtos portugueses". (Indústria Portuguesa, Maio de 1937: 2). Foi a época dos "cinco pês": "Portugueses Patriotas Preferem Produtos Portugueses". Até parece que isto é um apelo dos nossos dias, das forças políticas actuais. Não, isto vinha escrito no orgão oficial da AIP (Associação Industrial Portuguesa) na sua revista Indústria Portuguesa em... 1937!!! Portugal - como já por diversas vezes referimos - parece que, historicamente, se tem limitado a andar em círculo, ao longo da sua longa História. Mas, se recuarmos um pouco mais, vemos o mesmo em plena monarquia, isto é, as mesmas ideias, as mesmas razões, os mesmo apelos, as mesmas dificuldades de sempre, pintadas apenas com variegadas cores ajustadas ao tempo e espaço em que se desenvolvem. Por isso, quando ouvimos falar de entrada do FMI (via fundo de estabilidade da UE) não percebemos o dramatismo que alguns põem em tudo isto. Ele já por cá passou por duas vezes, e a última das quais nos anos 80, até deixou a casa bem arrumada, embora depois a tenhamos desarrumado de novo, cumprindo assim, o nosso destino histórico. Claro que preferíamos que ele (o FMI) não viesse, mas se vier - e até pensamos que virá - não será o fim do Mundo. Porventura, será um embaraço para os políticos que fizeram desta questão, uma questão de lesa-pátria - embora a direita política fique satisfeita com a sua entrada, visto - como alguns já afirmaram e bem - sirva para levar em frente a política que esta mesma direita pretende, que não tem coragem de referendar, empurrando para outros as culpas. Não é preciso um grande esforço para perceberem isto, basta ouvir algumas afirmações dos dirigente e outros responsáveis do CDS/PP e do PSD, bem como, de algumas figuras "independentes" que navegam na mesma área de pensamento. Por isso, se disse que este último leilão da dívida pública foi um exito - palavras do Governo - e logo a direita veio desvalorizar a situação até mostrando algum incómodo por tal sucesso. Curiosamente, o candidato Cavaco Silva não se excluiu desse grupo, apesar do discurso - sempre tortuoso - que utiliza. Mas sobre este assunto, não nos esqueçamos de que isto não é a solução para os nossos problemas. Não podemos continuar sobre o "cutelo" dos mercados dia após dia, e celebrarmos cada sucesso como se se tratasse da independência nacional. Portugal tem ainda muitos leilões para fazer durante este ano - o próximo é já na próxima quarta-feira - e veremos se esta tendência é para continuar ou não. Tem-se falado, - e penso que está confirmada - a pressão sobre Portugal da UE - leia-se Alemanha e França - para que o nosso país recorra ao fundo de emergência. Isto não significa que a UE - e, sobretudo, estes dois países -, estejam preocupados connosco. Portugal é um país pequeno, periférico, com uma economia pequena e fraca. O que motiva esta gente é o possível contágio de Portugal a outras economias como a espanhola, italiana e belga. Sobretudo, a espanhola, que é uma economia forte, larga e que a recorrer à ajuda, levantará problemas complexos na UE, porque o fundo de emergência, neste momento, não tem dotação suficiente para injectar em Espanha. Daí se vir a falar no aumenta da dotação do fundo. Daí o leilão (protegido) de Portugal, a que assistimos na semana passada. Não nos deixemos iludir. O problema das finanças públicas é mais complexo do que se pensa, mas nada de diferente, daquilo a que já assitimos ao longo da nossa História. Como alguém disse, "a culpa de tudo isto é de D. Afonso Henriques que criou a primeira empresa falida a que chamou Portugal".
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