Equivocos da democracia portuguesa - 72
Sem dúvida alguma, a moção de censura anunciada pelo BE na semana passada, continuará a fazer o seu percurso nesta. A política portuguesa, cada vez mais, vive destes "fait-divers" que, para além de serem inconsequentes, não ajudam em nada a resolver os graves problemas do país. Mas os partidos estão mais preocupados com as suas estratégias do que com o bem do país, ou seja, o bem de todos nós. Cada vez será mais difícil incutir o serviço público junto dos mais novos, incutir o sentido de responsabilidade do voto - essencial em democracia -, incutir a racionalidade neste país cada vez mais afundado em contradições e equívocos. A moção do BE é um factor de irresponsabilidade enorme, dada a situação do país, e o fazê-lo em nome dos desempregados ou dos precários não chega. Se ela passasse o que iria mudar? Nada. A instabilidade ia continuar, agora mais ampliada, porque o país entraria numa nova e longa campanha eleitoral. Isto não significa que achemos que o governo deve continuar a passar entre os pingos de chuva sem se molhar. A política seguida tem sido desastrosa com graves custos para o país. Quanto a isto ninguém tem dúvidas. Mas o mais grave será daqui a dez ou vinte anos, quando se começarem a vencer os encargos que agora assumimos. Tal como este governo teve que assumir aqueles que à dez ou vinte anos foram assumidos pelos governos de então. Isto é um ciclo de empobrecimento terrível e, ou somos capazes de criar riqueza suficiente para quebrar este ciclo ou, inevitavelmente, entraremos no ciclo de pobreza tão conhecido dos economistas. Estamos a viver ao momento, ao dia, sem uma estratégia mais abrangente e sem as reformas estruturais que são essenciais e inevitáveis na máquina do Estado, mas também, o mesmo terá que ser feito ao nível empresarial, que vem vivendo à longas décadas na dependência do Estado, fenómeno que já vem desde o Estado Novo. E enquanto não nos mentalizarmos que temos todos, mas mesmo todos, que fazer um esforço de reconstrução - semelhante ao que fizeram a Inglaterra ou a Alemanha no pós-guerra -, não sairemos deste marasmos em que caímos, com tendência ainda para se agravar. Quando tudo se resume à estratégia (partidária) esquecendo tudo o resto, temos que assumir que as coisas não estão bem. Vejam-se as afirmações de Marcelo Rebelo de Sousa no passado fim-de-semana, quando diz que acha que o PSD deve continuar a apoiar o governo mas derrubá-lo a quando da apresentação do OE para 2012, seja qual for o OE apresentado!!! (Para além das já anunciadas abstenções do CDS/PP e do PSD, - para a moção de censura do BE -, a espada de Demócles continua sobre o governo, o que não afigura nada de bom para o futuro). Isto é irresponsabilidade pura. Ao fim e ao cabo, está a fazer o mesmo que o BE, só que com a crise anunciada num espaço temporal alargado, ou seja, Outubro. Ninguém pode viver numa instabilidade destas permanentemente, e é com surpresa que, ainda não vimos nenhum responsável, com funções ou sem elas, a vir a terreiro defender que é imperioso que os esforços se unam para ultrapassar esta crise enorme em que estamos mergulhados. Provavelmente, porque estas pessoas não são atingidas pela tão falada crise, porque se o fossem, como acontece com a maioria de cada um de nós, talvez já tivessem assumido outras posições mais concentâneas com o momento que vivemos. Sabemos que em democracia é assim, mas não podemos cair na estratégia do "vale tudo", sobretudo, quando uma parte do país está na vereda da indigência. Mesmo com o agravamento descontrolado do desemprego, ou com a incapacidade do Estado reduzir a despesa, ou a recessão que está de volta -, temas a que voltaremos proximamente -, há que ter algum respeito pelos portugueses para além do interesse partidário legítimo em democracia.
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