Equivocos da democracia portuguesa - 100
Hélas! Finalmente o grande debate! Como tudo o que é mediatizada, assistimos, mais uma vez, à montanha que pariu um rato. Ontem o debate entre Sócrates e Passos Coelho foi anunciado como o decisivo para as eleições, depois dele talvez não houvesse necessidade de o povinho ir votar. Afinal para quê? No fim, como quase sempre acontece quando as coisas são muito antecipadas, assistimos a mais uma troca de insultos entre os dois - nada a que não estejamos já todos habituados - mas as ideias, essas ninguém as revelou. E bastou ver o desconforto que Passos Coelho teve quando confrontado com o seu programa eleitoral e Sócrates com a sua responsabilidade. Afinal, no programa do PSD existem muitas ideias que põem em causa o estado social, disso não restou dúvidas, e se elas existissem, nada melhor que analisar o programa do PSD que está na internet. Mas isso já nós todos sabíamos, também, as questões que gostaríamos de ver discutidas, essas nenhum deles teve coragem para as pôr perante os portugueses. Como por exemplo, gostaríamos de ter ouvido o que cada um pensa sobre a evolução do país e os sacrifícios que todos vamos ter que passar, e sobre isto nada; depois, gostaríamos de saber como se vai proceder ao nível autárquico para a redução de câmaras e juntas de freguesia - como impõe o programa da "troika" - e o que vai acontecer aos muitos funcionários que nelas trabalham, - porque a simples deslocalização não irá absorver todos eles -, e sobre isto nada; depois gostaríamos de saber como vai ser o novo ordenamento do território face às medidas exigidas, e sobre isto nada; gostaríamos de saber o que vai acontecer ao SNS, porque muitos não sabem que temos um SNS dos melhores da Europa e do mundo - nós que sempre dizemos mal de tudo que é nosso nem sempre temos a percepção do que de bom existe por cá - e que não se poderá manter no futuro, porque o Estado não terá dinheiro para o continuar a subsidiar, e sobre isto nada; gostaríamos de saber, no limite, o que vai acontecer ao nosso sistema democrático - que não ficará igual ao que actualmente temos - e o que cada um pensa disso, e sobre isto nada. Afinal, o grande debate não respondeu a nada de fundamental, o resto já todos nós sabemos. Passos Coelho tem um programa liberal, Sócrates tem um programa igual aos das eleições anteriores, com alguns retoques, mas ambos, - ganhe quem ganhar - têm um programa bem mais abrangente e disciplinador como é o programa da "troika". Mas isto, já todos sabemos, os detalhes que era aquilo que interessava nem uma palavra. O jornalista também não fez melhor, para quem dizia que neste debate não existiam perguntas "tabú", convenhamos que ficou muito aquém das expectativas. Claro que no fim, e como é habitual, vêem sempre uns tantos dizer que venceu o A e outros que o B foi mais convincente, transformando o debate numa espécie de pugilismo político que é sempre degradante, que foi importado dos EUA, e que se pretende aplicar num espaço diferente com uma cultura política diversa. Neste espectáculo não entramos. Tudo ficou adiado para a campanha eleitoral - que em boa verdade já começou à muito - onde se vão continuar a ouvir as agressões, os insultos, as birras, - como tem acontecido nos últimos meses - mas as ideias, o bem-estar dos portugueses, isso nunca saberemos, porque não interessa que se dê opinião sobre estes temas antes das eleições, porque não dão votos e, quiçá, até podem vir a desbaratar alguns. Esse calculismo político que levou a esta crise política e a novas eleições, pegou-se a nós como sarna, ao fim e ao cabo, muito bem ilustrado na eloquente frase de Passos Coelho, "ir ao pote"! A partir de amanhã, começa oficialmente a campanha, para além dela é tempo de começarmos a pensar por nós próprios, naquilo que queremos para nós, para os nossos filhos e netos, exercendo a cidadania sem rodeios. Vejam o exemplo aqui ao lado na vizinha Espanha, com as manifestações patrocinadas por jovens sem esperança. Não pensem que não vai chegar aqui, em breve a teremos por cá, porque cada vez mais as populações percebem que têm que ter um papel mais interventivo na sociedade e no seu futuro, e não basta que de quatro em quatro anos, o deleguemos através dum voto, muitas vezes em quem não está interessado em nós. Como à dias notamos, o aviso da SEDES é muito importante e oportuno. "As condições políticas que existem em Portugal", diziam, "são cada vez mais parecidas com as que eram na I República e que conduziram à ditadura". Reflictamos sobre isto. Esta também é uma questão que os políticos não respondem, preferem andar entretidos a insultarem-se uns aos outros, porque para eles, fora da "classe política" não existe mais mundo.
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