Equivocos da democracia portuguesa - 198
Ontem fomos surpreendidos - ou talvez não! - pelos números divulgados pela Direção Geral do Orçamento (DGO). Ficamos a saber que temos este ano um buraco colossal de 3 mil milhões de euros para a execução orçamental ainda para este ano de 2012. Isto significa que o ambicionado e imposto déficit para este ano de 4,5% está definitivamente comprometido. Já vínhamos afirmando que tal seria quase impossível com as medidas que estão a ser impostas. Senão vejamos: a imposição de restrições - algumas que vão muito para além do memorando da "troika" - fizeram que o país entrasse em recessão, o desemprego atingisse números históricos - e não vai ficar por aqui! -, logo, se as famílias têm menos dinheiro acabam por comprar menos, a produção terá que ser ajustada pelas empresas, o que inevitavelmente, conduz ao aumento de desemprego. Se há menos emprego, há mais contribuições do Estado para esses trabalhadores que viraram improdutivos contra a sua própria vontade, o IRC vai contrair-se porque as empresas estão com mais dificuldades, como existem menos transações o IVA dá menos receita e assim sucessivamente, vai daí as receitas fiscais - chamemos-lhe - normais - por parte do Estado vão diminuindo. E a recessão não só continua como se agrava. O único imposto que aumenta é o IRS, imposto que incide sobre os rendimentos do trabalho a que não se pode fugir. Com este cenário, para além da contração da economia, vai aparecendo cada vez mais florescente, a economia paralela. É de qualquer manual básico de economia que o aumento de impostos quando ultrapassa a chama "propensão marginal" conduz a uma diminuição da receita fiscal. Qualquer aluno de economia dos primeiros anos sabe isto, mas parece que entre nós há quem pense que pode aumentá-los indefinidamente, e que cobra sempre mais e mais. É caso para dizer que nem no tempo do Robin Hood tal acontecia!!! Daí que estamos em apuros, e normalmente nestes casos, o Estado utiliza a maneira mais rápida e fácil de obter fundos para controlar o déficit que é... aumentar ainda mais os impostos. Mas em Portugal a carga fiscal já é excessiva, já se ultrapassou aquilo a que os economistas chamam "propensão marginal", daí que tenhamos alguma curiosidade em saber o que vai sair da cartola. Não será seguramente um coelho porque esse já lá está - no governo, bem entendido -, ficando a pergunta de saber que outra coisa será afinal? Claro que, também se pode recorrer - mais uma vez - às chamadas "receitas extraordinárias" - embora o PM tivesse afirmado que nunca mais o faría, mas nós sabemos o que vale a palavra de político - e ainda o puderá fazer recorrendo às pensões da banca. Claro que tudo isto tem um significado que Miguel Beleza define muito bem como "receitas desonestas", ou seja, dar a volta à situação fazendo parecer que tudo está bem e mesmo controlado, o que não é o caso, infelizmente para nós todos. E mesmo para aqueles que falam no exemplo das intervenções anteriores do FMI no passado em Portugal, é bom dizer, que tal nada tem a ver com a situação atual. Nessa altura discutia-se um valor na casa dos 73 mil milhões de euros, hoje discute-se 730 mil milhões de euros, ou seja, dez vezes mais!!! Nessa altura, podíamos desvalorizar a moeda e hoje não, nessa altura podíamos manipular as taxas de câmbio e hoje não, diríamos até que felizmente, porque o efeito é sempre de curto prazo. Chegados aqui, vem-nos à memória as palavras de Almeida Garrett in "O Arco de Sant'Ana": "... e consultando e deliberando estavam. Mas o resultado de todas estas consultações e deliberações tinha sido aquele tão legítimo, tão clássico e proverbial português de: amanhã veremos". Claro que do lado do PSD o seu porta-voz apressou-se a dizer que tudo está a correr pelo melhor, o que levou a que um seu correligionário de partido e conselheiro de Estado, António Capucho, tivesse que admitir que se deve ter tratado dum "lapsu linguae" para não dizer coisa pior. Logo a seguir, vieram apressadamente dizer que afinal talvez seja preciso mais austeridade para se cumprir os famosos 4,5% do PIB. É que não está só em causa a execução deste ano, mas também a do próximo, será bom não esquecer. E chegados aqui, será legítimo perguntar afinal para que foram os sacrifícios dos portugueses? Como o Estado ainda não foi capaz de reduzir as suas despesas duma forma significativa, fica a ideia de que os portugueses em geral, as empresas privadas, fizeram a sua parte, mas o governo não, ficou "de catedra" a ver o país depauperado e miserável. Triste sina a nossa, que tais governantes tem, afinal aqueles que, como dizia Miguel Macedo - hoje ministro! - que tinham a solução para em dois ou três meses resolver o problema. Agora se vê a falta de seriedade porque ou o ministro - então líder parlamentar do PSD - não sabia o que dizia, ou a medida de tempo do atual ministro da administração interna é bem diferente da utilizada no sistema métrico convencional. De colossal buraco em colossal buraco, Portugal vai-se afundando, - e nem o otimistmo do Pontual nos salva -, onde não existe a coragem governamental de admitir que o caminho seguido está errado e optar por outros rumos, - António Capucho dixit -, que os há, embora se tente fazer crer que não. Ou esta política, ou o dilúvio. O que do modo como as coisas vão, não parece existir qualquer diferença entre elas. Mais uma vez olhamos para o escrito de Garrett: "Assente e aceite este grande ultimatum da política portuguesa, que mais há que fazer? Os ministros adormecem nos seus gabinetes doirados, os senadores nas suas curuis de marfim, e os próprios tribunos - quando os há - roncam nos seus escanos de pinho, porque tudo está dito e tudo está feito. Boas noites, amada pátria, e até amanhã".
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