Equivocos da democracia portuguesa - 248
Temos vindo a assistir nos últimos dias à maior
encenação política digna dum qualquer filme de Hollywood. O governo que sempre ostracizou
a oposição, nomeadamente o PS, faz uma inflexão digna de contorcionista, e
chama o PS para conversações. Que terá acontecido para que esta inflexão
tivesse ocorrido? Quando o governo afirmou por várias vezes que avançaria com
o acordo ou sem o acordo do PS então porquê esta atitude? Não será difícil de
compreender que por trás disto esteja a mão da "troika" que percebe que
vai haver necessidade de implementar políticas que vão muito para além da legislatura
e por isso necessitam do comprometimento do PS. Só assim se compreende tamanha
acrobacia vinda dum governo que se tem mantido autista perante a oposição e
perante o país. Com isto, para além de Passos Coelho ficar entalado, ele fica
ainda pressionado, desde logo, pela "troika", depois pelo Presidente
da República que, desde a Colômbia, não deixou de saudar a atitude e, depois,
pelo seu parceiro de governo que no último fim-de-semana não deixou de lançar
mais umas farpas. É certo que, também António José Seguro não fica em melhor
posição. Com um congresso à porta, não quererá deixar transparecer que está
disponível para um acordo. Mas, como disse ontem Seguro, "não houve nada de
novo da reunião com o governo e com a "troika"", mas temos a firme convicção de que nada ficou como dantes. A necessidade dum consenso é já
assumida por muitos, mesmo por figuras que nada têm a ver com o executivo. Sem
ela, dificilmente a "troika" libertará qualquer ajuda e a sétima avaliação ainda não está fechada ao que nos parece face ao comunicado da "troika" emitido hoje desde Bruxelas. Mas, e apesar
disso, temos muita dificuldade em acreditar que tal seja possível com Passos
Coelho à frente do executivo. Com outro governo, mesmo que desta maioria, mas sem
Passos Coelho, pensamos que tudo seria mais fácil. Com um primeiro-ministro
casmurro, arrogante, que se acha detentor da verdade absoluta, com um projeto ultra-liberal como programa político, pensamos que
dificilmente tal consenso apareça sem que o PS perca a face. Foi curioso ouvir
hoje o novo ministro-adjunto e do Desenvolvimento Regional, Miguel Poiares Maduro que, na sua primeira
aparição repetiu até à exaustão o termo "consenso". (Se para alguma coisa serviu esta "remodelação" talvez tenha sido a de criar condições de maior abertura intelectual a um governo pouco inteligente). Mas também não deixou de ser estranho que nenhum ministro do CDS/PP estivesse presente nessa conferência de imprensa. É certo que como ontem afirmou Seguro "o governo
só apela ao PS quando tem um problema" e, estamos certos que o problema é
enorme e que a pressão da "troika" que começa a falar mais grosso com
o executivo, não foi a menor das razões. Nesta embrulhada em que o governo nos
meteu parece que estaremos perante grandes decisões a curto prazo. E elas têm
que aparecer. Portugal está cada vez mais à beira da bancarrota - bem pior do
que Sócrates deixou o país por mais que desagrade a muitos - e que o autismo do
executivo só veio a potenciar. O desfasamento entre o orçamento e a execução
fiscal é cada vez mais evidente, e o "gap" que daí deriva (por
estimativa) pode levar a um aumento de impostos (embora o PM tenha negado tal!)
nomeadamente o IVA. Aquilo que era a solução que o PSD tinha para em dois meses
debelar a crise, afinal tornou-se num buraco negro cujas consequências ainda
estamos longe de perceber. Este ajuste demorará uma geração - já aqui o
defendemos por variegadas vezes - e agora Vítor Gaspar acabou por vir, há dias,
confirmar esta nossa asserção. Daí que esta longa noite em que fomos
mergulhados ainda esteja para durar e não sabemos bem quando um sol radioso
fará a sua aparição. Até lá, continuaremos a assistir a estes contorcionismos
circenses a que o desespero político inevitavelmente conduz.
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