Equivocos da democracia portuguesa - 263
A semana começa com uma surpresa ou talvez não. Vítor Gaspar demitiu-se de
ministro das finanças. Assume o fracasso das suas políticas - o que só lhe fica
bem - mas diz também que não tem condições para continuar. Já há muito se
falava sobre esta possibilidade que foi crescendo nos últimos dias. Hoje
sabemos que tivemos um ministro das finanças demissionário durante oito meses e
que só ao terceiro pedido para sair este foi aceite por Passos Coelho! O
que não deixa de ser estranho. Com que vigor Gaspar poderia fazer orçamentos
retificativos, negociar com a “troika” ou representar Portugal no exterior
quando se sabia a prazo? (Sem pôr em causa o profissionalismo do
ministro como é óbvio). Isto vem demonstrar aquilo que já por aqui vimos afirmando há
muito tempo, a saber, que este governo está sem rumo e sem liderança apenas
mantido pelo Presidente da República - que é da mesma tendência política - numa
teimosia que ninguém compreende apesar das anotações mais ou menos esfarrapadas
que lança nos media. Mas quando se está em lenta agonia, como parece ser o caso
deste governo, já nada se espera de razoável. A substituição de Vítor
Gaspar por Maria Luís Albuquerque – que está envolta em acesa polémica por
causa dos "swaps" - diz bem do desnorte de que, por variadas vezes,
já aqui fizemos eco. Substituir um ministro por um secretário de Estado é
sempre polémico e trás constrangimentos até ao nível do relacionamento, mas quando o novo ministro está envolto em polémica ainda antes de o ser é, no mínimo, grave. Não
está em causa a figura ou a competência da antiga secretária de Estado do
tesouro, nem sequer a sua envolvência no caso dos "swaps" - e sobre
este assunto temos uma leitura bem diferente da voz corrente como já tivemos
oportunidade de assinalar neste espaço - mas dá um sinal de que Maria Luís foi
uma segunda, terceira ou quarta escolha. No limite até se pode pensar que
Passos Coelho convidou várias personalidades e que nenhuma aceitou, o que
coloca o governo ainda em maior fragilidade. No entretanto, sabe-se que a “troika”
já não acredita nas reformas e na força política do governo para as levar a
cabo. A mesma “troika” que aplica a receita tipo a todos os países sem se
preocupar com as especificidades de cada um, conduzindo os países para a vereda
da miséria e do esgotamento, como está a acontecer a Portugal! Neste emaranhado
de confusões, em que os conflitos internos do mesmo não são coisa menor, só a
clarificação da situação política nos parece atitude sensata, e para isso só
resta devolver a palavra ao povo. A saída de Gaspar - o ministro mais forte do
executivo, o número dois - diz bem do nível de desagregação deste. Mas na hora
da despedida, Gaspar quis deixar uma carta para memória futura. (Que podem ler
no link http://downloads.expresso.pt/expressoonline/PDF/carta%2001072013.pdf ).
Nela Gaspar assume os seus erros, como atrás já fizemos referência, mas vai mais longe, dizendo da falta de condições
e até da autoridade que não lhe foi dada - sobretudo na 7ª avaliação da
"troika", avaliação complicada e nunca cabalmente explicada - mas põe
a nu as fragilidades e os desentendimentos dentro do próprio governo. Assumimos
aqui a nossa visão diferente da de Gaspar, vítima da sua visão ideológica
ultraliberal, mas não queremos aqui deixar de sublinhar o desassombro dum texto
que é esclarecedor sobre muitas coisas. Apenas nos fica a bailar na mente uma
singela questão: porque foi divulgada publicamente esta carta? Já muitos
ministros se demitiram e nunca as suas cartas foram divulgadas. Porquê esta e
neste momento? Mais uma nublosa das muitas que povoam este executivo.
0 Comments:
Post a Comment
<< Home