Equivocos da democracia portuguesa - 303
Ontem foi um dia extraordinário, cheio de coisas extraordinárias, numa democracia doente que a cada dia que passa dá sinais de erosão. Desde logo, a manifestação das forças de segurança na Assembleia da República. A manifestação das forças de segurança é de todo legítima num país esmagado por uma carga de austeridade sem precedentes. E eles, os polícias, também têm famílias que têm que sustentar, casas ou rendas a pagar, contas que todos os meses se renovam para liquidar. A manifestação é por isso legítima dentro da situação excecional que o país está a viver. Já o mesmo não diríamos do rompimento do cordão policial. É certo que ouve alguma tensão mas, felizmente, tudo decorreu com civismo. (Para além duns petardos que foram rebentados, o que não deixa de ser irónico numa manifestação de forças de segurança!) . Mas perguntamos, será que existiria o mesmo civismo se fosse a manifestação duma outra qualquer classe profissional? É que o rompimento do cordão policial (dos polícias que estavam em serviço) pela parte dos manifestantes (os polícias que se estavam a manifestar) é um precedente muito grave. Com que legitimidade é que a polícia fica quando perante uma qualquer outra manifestação tentar subir as escadas e receber uma carga policial? Será que os polícias recuarão para junto da Assembleia da República como o fizeram ontem? Ou será que utilizarão a força, como já vimos por diversas vezes, até duma forma desmesurada e desproporcional, que serviu para nos envergonhar na Europa e no mundo por onde as imagens correram? Será que a partir de agora, os jardins e a escadaria do Parlamento serão terreno para os manifestantes ou não? Ou será que só quando são as forças de segurança a manifestarem-se é que tal é legítimo? "Foi criado um precedente muito grave" afirmava ontem Morais Sarmento no seu comentário na RTP1 em simultâneo com o que estava a acontecer no Parlamento. "Sinais excecionais e extraordinários de extrema gravidade" como diria Mário Crespo na SIC Notícias. Estes são sinais de que a democracia está a apodrecer por dentro, no seu seio, sem que ninguém aparentemente pareça notar. Exceção feita a alguns mais atentos e combativos, com provas dadas, desde logo, como Mário Soares que ontem pediu a demissão do Presidente da República e do governo. De facto, estão a criar-se as condições para que o desgaste das populações, a descrença, a desesperança se vão instalando na sociedade e levem à aparição dum qualquer "caudillo" à la carte. Convidamos a que leiam o que se escrevia nas vésperas do 28 de Maio de 1926, - que daria lugar à instauração da ditadura do Estado Novo -, e verão a similitude do que se está a passar nos nossos dias. A situação está a tornar-se perigosa, demasiado perigosa, para que olhemos para o lado. Este grupo de pessoas que hoje nos (des)governa está a levar Portugal para o abismo criando as condições duma saída musculada para "arrumar a casa" como costumam dizer os candidatos a ditadores que não faltarão por aí. Todos sabemos como as ditaduras começam, o que não sabemos é como e, sobretudo, quando acabam. É preciso que tenhamos consciência do perigo em que estamos, mas também temos que saber que existem outras saídas para esta situação, bem para além daquelas que este grupo de pessoas nos vende diariamente. O caminho pode ser outro. Todos o sabemos. E não basta utilizar as pressões sobre o Tribunal Constitucional para justificar o falhanço. Esta política falhou. Este governo falhou. (Mais uma vez apelamos a que leiam com atenção a acarta de demissão de Vítor Gaspar). Este Presidente da República falhou por querer manter o seu grupo no poder. É necessária uma mudança. Uma mudança urgente, enquanto é tempo.
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