"A Confiança no Mundo - Sobre a Tortura em Democracia" - José Sócrates
José Sócrates figura incontornável da política portuguesa aparece agora num registo completamente diferente. Desta feita, com um ensaio - a sua tese de mestrado - com o título "A Confiança no Mundo - Sobre a Tortura em Democracia". Um livro muito interessante e bem escrito sobre o fenómeno da tortura e a sua legitimação em regimes democráticos. Se em regimes totalitários essa é a prática, em democracia parece ser um pouco mais difícil de aceitar e justificar. Depois de lermos este ensaio ficamos com a ideia de que esta embaraçante questão começa essencialmente pela mão da França no conflito que teve que gerir na Argélia. Se antes, - depois do fim da II Guerra Mundial -, em que vieram a lume as enormes atrocidades feitas pelos nazis, o certo é que os Aliados não enjeitaram o mesmo caminho depois da vitória. O caso mais paradigmático foi o da França de De Gaulle a quando da resistência e depois, cm todo o saber acumulado, o aplicou nas suas colónias como a Argélia. Esta só foi eliminada da França quando houve uma ameaça de golpe de Estado. Mas depois, estas situações não pararam no mundo. "Desde as guerras coloniais até à guerra fria, hoje pretende legitimar-se na guerra contra o terror".Camuflada para evitar os olhares do mundo ela sempre foi existindo, até que chegados aos nossos dias, assistimos ao paradoxo duma das democracias de referência, como é o caso da democracia americana, estas práticas serem legalmente legitimadas o que levou a enormes atrocidades em Abu Ghraib no Irão, e depois em Guantánamo em Cuba. Fora os outros casos de que não se tem registo, mas que se sabe existirem, nas prisões fantasmas (secretas) mantidas pela CIA. Como foi isto possível? Como é que uma democracia foi capaz de gerar no seu seio estas atrocidades? Estas e outras questões são o objeto deste livro onde José Sócrates pretende cimentar informação baseado em alguns dos mais prestigiados autores que abordaram esta problemática. Um livro muito bem escrito, de leitura fácil, onde as referências às fontes utilizadas estão muito bem assinaladas e transcritas. Um livro que nos leva a uma reflexão profunda sobre um tema tão importante nos nossos dias. Afinal, a democracia que parecia ser uma espécie de regime perfeito, quiçá, redentor, também tem os seus pecados de que não se pode eximir. Com o prefácio assinado pelo ex-Presidente da República do Brasil, Lula da Silva, este livro deve merecer a nossa atenção e, sobretudo, a nossa reflexão, nestes dias de ira em que parece que o mundo está mergulhado. Como escreve o autor: "A linha vermelha da dignidade humana é uma defesa da democracia face a ela própria. Nos momentos de pânico e de descontrole, a democracia precisa de continuar a respeitar-se, ela não pode ter vergonha de si mesma nem acanhar-se dos seus valores. Mesmo em exceção, a democracia deve ser capaz de se 'reconhecer' como uma democracia". A edição é da Babel. Um livro a todos os títulos recomendável.
0 Comments:
Post a Comment
<< Home