Turma Formadores Certform 66

Thursday, February 06, 2014

Equivocos da democracia portuguesa - 319

As trapalhadas em que os nossos governantes nos mergulham formam uma verdadeira parada infindável. A última tem a ver com a célebre coleção de quadros de Joan Miró, o importante pintor catalão. Uma parte significativa e valiosa da sua coleção foi em tempos comprada pelos donos do BPN. Agora, são propriedade do Estado Português que sem mais delongas, numa visão míope de contabilista fracassado, quis pôr à venda em Londres, tendo para tal escolhido a célebre leiloeira inglesa Christie's. Desde logo, se coloca a questão do porquê da alienação desta importante coleção? Tivemos a resposta ontem, pela boca do secretário de Estado da cultura, - (aqui utilizamos cultura com letra minúscula que representa melhor o que estes governantes pensam dela) -, Barreto Xavier, que afirmou que, "o governo quer liquidar as dívidas do BPN com ativos do próprio banco sem recorrer a outros estratagemas" (pedimos desculpa por alguma incorreção porque citamos de cor). O que aqui disse o secretário de Estado é que, a partir de agora, e sempre que tivermos uma dificuldade financeira, há que ir a um museu e ver o que se pode vender, ou talvez um palácio, ou um conjunto deles, dada a extensão da dívida. Depois do primeiro-ministro ter convidado os portugueses a irem morrer longe - leia-se a imigrar - agora acha que pode começar a vender tudo e mais alguma coisa numa estratégia de merceeiro no mínimo questionável. Já muito foi alienado a preço de saldo, inclusive a parte mais apetecível do BPN ao banco BIC ficando o Estado com o lixo que lá existia. (Mas não esquecemos que o presidente do banco é um PSD, ex-ministro de Cavaco Silva, de seu nome Mira Amaral!). Aí não se pensou em vender bem para arranjar dinheiro para liquidar o que de mau tinha o banco, e só agora, se vem lançar mão das obras de Miró para tal efeito. É do conhecimento geral que a cultura está tutelada pelo primeiro-ministro e que o secretário de Estado é um mero executor. (Uma "inexistência" para usar a feliz frase de Constança Cunha e Sá ontem na TVI24). Todos sabemos que a cultura é algo que incomoda este governo, ou porque tem a noção que dela só conhecem o nome, ou porque quanto mais incultas as gentes mais manobráveis são, algo que a História recente já nos ensinou e que os menos jovens conhecem muito bem. Perante a onda que em boa hora se levantou contra esta barbárie cultural, a Christie's retirou do leilão a referida coleção, horas antes de este começar. A maneira abruta como foi feita, uma desmontagem incrível e sem qualquer cuidado, mostra bem o desconforto e o desrespeito que a galeria tem para com as obras e para com Portugal. Todos vimos isso na televisão, e o reparo que Joe Berardo fez no Jornal da Noite da SIC também ontem, foi apenas e só a confirmação do que todos vimos. Depois do tribunal não aceitar a providência cautelar visto ser feita por uma empresa privada e não pelo Estado - artificialismo a que o governo recorreu para iludir a questão - a saída das obras foi ilegal, não tendo sequer sido catalogadas e  inventariadas. Havendo inclusive pareceres contra o leilão das mesmas, como foi o caso da Direção-Geral do Património Cultural. No momento em que escrevemos, sabemos que o Ministério Público já interpôs uma providência cautelar quanto à saída das obras, apontando para a ilegalidade cometida. Mas será que toda esta trapalhada nos deixa perplexos? De todo. Afinal quando o governo eliminou o ministério da cultura e o substituiu por uma mera secretaria de Estado, dependendo esta do primeiro-ministro, ficou clara a intensão do que a cultura representava para o executivo. O mesmo executivo que lança uns jotas a pedir referendo para evitar a aprovação de leis, o mesmo executivo em que outros jotas pedem a diminuição da escolaridade obrigatória, o mesmo executivo, também de alguns jotas, que diminuiu as verbas para a ciência e que está interessado em cursos superiores de dois anos (!), - sim, porque as pessoas não devem ser demasiado cultas porque tal as torna mais exigentes e reivindicativas -, ainda haverá espaço para que fiquemos surpreendidos? Julgamos que não. Trata-se afinal da política mesquinha e rasteira que vem assolando Portugal, condenando-o à miséria, aqui não só material, mas também cultural. Já agora deixamos neste espaço uma sugestãozita ao primeiro-ministro. Não poderia começar a vender os carros de luxo que tem e a substituí-los por outros mais modestos? Não poderia diminuir no número de secretárias que o rodeiam? Não poderia diminuir nas mordomias dos ministérios e de alguns "boys" que por lá andam? Talvez seja mais fácil do que vender as obras de Miró ou outros atentados à cultura do mesmo jaez. Deixem a cultura em paz, já que não são capazes de a apreciar nem de a compreender!

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