Turma Formadores Certform 66

Monday, September 08, 2014

Equivocos da democracia portuguesa - 232

É curiosa esta estranha maneira que os senhores da governação têm de tratar os seus concidadãos, dando a ideia que estes são uns adolescentes irresponsáveis, de baixa instrução, a quem pode ser vendida toda e qualquer ilusão, que não dão por nada. Esta anomalia da nossa democracia - existem outras - é transversal a várias governações, não sendo por isso, um exclusivo deste executivo. Mas este é que o está em funções e é a este que temos que desmascarar os embustes que vão surgindo. Modos de falar no chamado "discurso redondo" que não clarifica. Apenas confunde e deturpa pelo menos face aos menos preparados. Tudo isto para chamar a atenção da meta prevista do défice para este ano, que a governação ultraliberal tem apontado para os 4%, cumprindo assim os acordos com os credores. Contudo, não há bela sem senão, e os 4% parecem que serão um pouco mais, na casa dos... 10% do PIB!!! Quem o vem revelar é a UTAO - Unidade Técnica de Apoio Orçamental, que diz que andaremos próximo deste número, em contabilidade nacional, ao incluir as medidas extraordinárias com a recapitalização do Novo Banco. A UTAO afirma que "a confirmar-se a classificação do reforço do capital do Novo Banco como uma transferência de capital em contas nacionais, as operações de natureza extraordinária contribuem para agravar o défice em 5,9 pontos percentuais do PIB". A UTAO admite assim que "embora o défice ajustado seja idêntico nos dois orçamentos retificativos, o défice total difere significativamente, sendo revisto de 4% no primeiro orçamento rectificativo para 10% no segundo rectificativo" deste ano. E acrescenta: "Este valor coloca o défice total das administrações públicas ao nível mais elevado dos últimos anos, apesar de o défice ajustado [excluindo as operações extraordinárias] ser, pelo contrário, um dos de menor dimensão em percentagem do PIB, dado o elevado montante das operações extraordinárias". Isto que o governo está a fazer não é algo de anormal apenas não está a esclarecer toda a envolvente, escondendo uma parte da verdade. Esta esperteza saloia duma governação que acha que passa a perna aos incautos tem destas coisas, são logo "apanhados" por um organismo do Estado que muito tem contribuído para o esclarecimento e aprofundamento de matérias de índole orçamental, cujo trabalho se tem revelado tecnicamente isento e de grande qualidade. Como diz o povo, "apanha-se mais depressa um mentiroso do que um coxo". Aqui não se trata duma mentira "lato senso", mas duma verdade que apenas é dita pela metade. E os retificativos aí estão para o esclarecer, embora nem todos os saibam ler. Claro está que uma parte deriva deste último retificativo e prende-se com a subscrição do Novo Banco pelo fundo de Resolução (-2,9% do PIB), a reestruturação financeira da CP (-2,3% do PIB) e da Carris e STCP (-0,7% do PIB). A isto ainda se acrescenta o "write-off" de crédito mal parado do BPN Crédito pela Parvalorem (-0,1% do PIB). Já agora, e apenas a título de esclarecimento, indicamos as cinco medidas anteriores que já vinham de trás com o anterior retificativo, a saber, as indemnizações por rescisão (-0,2% do PIB), as transferências de saúde dos CTT (+0,1% do PIB), os dividendos da EGREP (sem impacto em percentagem do PIB), a concessão dos Portos e Marinas (+0,1% do PIB) e a concessão da Silopor (também sem impacto no PIB). Com esta clareza cristalina, se vê a maneira como é usual dizer-se "com papas e bolos se apanham os tolos". Como se isto não era já, só por si suficiente, a ministra das Finanças admitiu na passada semana na Universidade de Verão do PSD que, afinal, a austeridade não terminará tão rápido quando se dizia e que ainda teremos algum tempo - muito tempo, dizemos nós - pela frente até que tal aconteça. A dívida aí está para nos lembrar o enorme embaraço em que estamos metidos, embora a governação tente sempre desvalorizar o inevitável. (Se analisarmos aquilo que a "troika" definiu para o crescimento da dívida e a realidade, verificamos uma diferença enorme de vários milhões de euros. Esse "gap" deve-se à austeridade excessiva e errada, segundo muitos, - nós incluídos -, que se seguiu. Daí que as palavras desassombradas de Draghi a semana passada nos EUA - e logo repudiadas pela Alemanha - mostrem que a Europa - excluindo a Alemanha - está a fazer o seu ato de contrição. Aqueles que não aceitaram as regras do jogo como a Grã-Bretanha estão a crescer, enquanto a zona euro está estagnada. E isso significa o empobrecimento dos países e das populações, regra a que Portugal não escapará e que já está a sentir na pele desde à algum tempo). E o embaraço é tal que, no mesmo local a ministra das Finanças até acha que se deve agora discutir a questão da dívida no Parlamento! (Talvez já seja um pouco tarde para isso, não acha, Sra. Ministra?) Deste modo a ideia peregrina de Paulo Portas "do fim do protetorado" não é bem assim. Como temos um controlo por parte da "troika" por mais vinte anos, já estamos esclarecidos. A vinda destes senhores - os do "protetorado" - está para breve. E como escrevemos em tempo oportuno, se Portas falava numa espécie de 1640 da economia, deveria saber - e ele sabe - que a independência não aconteceu logo como que por milagre. Foi algo que durou muito tempo e não menos trabalhos. Talvez se Portas esclarecesse isso aos portugueses não fosse mau - ou ele pensa que todos sabem, ou a verdade é inconveniente - e os portugueses agradeceriam a clareza, sinceridade e transparência. Fatores que andam tão arredados da nossa política e que levam à descrença de cada vez mais pessoas naquilo que essa classe - sim, porque são uma classe - lhes diz, ou melhor, não lhes diz. Enquanto os políticos pensarem assim, a democracia é seguramente flagelada, o país empobrecido, as pessoas não motivadas. E não será seguramente assim que poremos fim ao tal "protetorado".

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