Turma Formadores Certform 66

Wednesday, December 09, 2009

O Pe. António Vieira e o seu "Sermão de Santo António aos Peixes"


Depois de virmos assistindo ao degradar das relações entre os políticos e as instituições políticas, de que ontem fizemos nota, só nos resta ler aquilo que os nossos antepassados mais notáveis tinham a dizer sobre as fraquezas do seu tempo. Bem poderíamos ir às "Farpas" de Ramalho Ortigão ou aos romances do Eça de Queiróz. Contudo, e pela sua actualidade, resolvi trazer-vos algo mais distante no tempo, mas mais contundente na crítica, como o foi o Pe. António Vieira, e o seu famoso "Sermão de Santo António aos Peixes". Este "sermão" foi proferido na cidade de São Luíz do Maranhão em 1654, na sequência de uma disputa com os colonos portugueses no Brasil. O "Sermão de Santo António aos Peixes" constitui um documento da surpreendente imaginação, habilidade oratória e poder satírico do Pe. António Vieira, que toma vários peixes (o roncador, o pegador, o voador e o polvo) como símbolos dos vícios daqueles colonos. Com uma construção literária e argumentativa notável, o sermão pretende louvar algumas virtudes humanas e, principalmente, censurar com severidade os vícios dos colonos. Este sermão (alegórico) foi pregado três dias antes do Pe. António Vieira embarcar ocultamente - "a furto", como se dizia na época - para Portugal, para obter uma legislação justa para os índios. Todo o sermão é uma alegoria, porque os peixes são a personificação dos homens. Sobre o autor apenas vos digo que António Vieira nasceu em Lisboa a 6 de Fevereiro de 1608 e viria a falecer a 18 de Julho de 1697 na Bahia. Foi um religioso, escritor e orador português da Companhia de Jesus. Um dos mais influentes personagens do século XVII em termos de política, destacou-se como missionário com os indígenas em terras brasileiras. Nesta qualidade, defendeu infatigavelmente os direitos humanos dos povos combatendo a sua exploração e escravização. Era por eles chamado de "Paiaçu" (Grande Padre/Pai, em tupi). António Vieira defendeu também os judeus, a abolição da distinção entre cristão-novos (judeus convertidos, perseguidos à época pela Inquisição) e cristãos-velhos (os católicos tradicionais), e a abolição da escravatura. Criticou ainda severamente os sacerdotes da sua época e a própria Inquisição. Na literatura, os seus sermões possuem considerável importância no barroco brasileiro e português. Este foi um livro que tive que ler, já lá vão muitos anos, quando frequentava o ensino secundário, na disciplina de português, e sempre me senti fascinado por este texto. Parece que os nossos políticos já não são dessa geração, porque se o tivessem lido, com toda a certeza, evitariam o triste espectáculo que nos dão diariamente. Agora que estamos encostados ao Natal, aqui fica a nota para uma boa prenda, numa edição de textos antigos, que a "Oficina do Livro" está a lançar. O título com que aparece ao público é "Sermão de Santo António aos Peixes e Outros Textos". Aqui fica a sugestão, e se possível leiam-no porque vão descobrir muitas aproximações à nossa realidade actual, mais do que aquilo que julgam.

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