Turma Formadores Certform 66

Thursday, November 04, 2010

Equivocos da democracia portuguesa - 56


Estamos a assistir à discussão do OE para 2011. (Aqui na AR onde nos encontramos, podemos ver muitos jovens nas galerias, alunos de várias escolas e universidades. Eles que são o futuro deste país que pensarão? Talvez estejam um pouco confusos com todo este carnaval mediático). Para além das promessas de intensão de todos os partidos, esta é uma discussão que é uma mera formalidade porque o OE já está aprovado na generalidade, com a abstenção do PSD, que já foi acordada com o Governo. E é sobre este acordo que queremos falar. Depois duma inusitada encenação, que só prejudicou o país, - analisem os juros da dívida pública durante esse período -, este acabou por acontecer com o patrocínio do PR. Foi bom para o país, sobretudo porque se evitou uma crise política - para já! - porque a posição do PSD é clara, e está à espera da sua oportunidade, que deseja breve, para regressar ao poder. E isto não escapa aos observadores externos que responderam com um novo agravamento dos juros, depois de estes terem regredido após o acordo entre o Governo e o PSD. Estas não são atitudes responsáveis de um partido responsável que já prejudicou muito o país, até mesmo no passado recente - veja-se a fuga de Durão Barroso e o descalabro de Santana Lopes - pelas hesitações que teve no acordo que firmou, o que levou até a uma forte crítica de alguns dos seus membros mais destacados, como foi o caso de Manuela Ferreira Leite. A atitude do PSD é tanto mais incompreensível visto saber que não existe outro caminho para trilhar, algo com que alguns dos seus membros já concordaram. O PSD ajuda a viabilizar o OE com a sua abstenção, mas não quer aparecer colado a ele. Isso viu-se no debate, na crispação que existiu entre os dois partidos e o governo. Tal verificou-se até, com a famosa fotografia do acordo, - que deixamos aqui para a posteridade - que não foi autorizada pela direcção do partido. Mas, apesar disso, não é o suficiente para passar uma esponja sobre os actos que se tomam. Quer queiram, quer não, a ligação entre os dois partidos e o governo fica gravada a ferro e fogo, embora muitos não o queiram admitir. Achamos este OE muito mau, as populações vão senti-lo duma forma muito dura, e cremos que o governo - que convenhamos, também não tem andado bem em tudo isto - não tem dado indicação de conseguir actuar duma forma clara e eficaz do lado da despesa. Não é só do lado da receita - isto é, de todos nós - que se deve actuar. Pode ser o mais fácil mas, seguramente, não é o mais justo. A ideia do Estado gastador é por demais evidente, e não podem ser as populações a pagar as diatribes dos poderes públicos. (Nós que conhecemos o funcionalismo público, sabemos bem do que falamos). Parece que o tango não correu bem, depois passou-se ao baile mandado (de Bruxelas) e neste debate parece mais que se está próximo do rap mais marginal. Contudo, neste segundo dia, o confronto foi mais ameno, talvez pela intervenção no facebook e no twitter de Cavaco Silva, que já está em pré-campanha - só foi pena o não ter feito noutras ocasiões, e houve muitas ao longo destes anos. Para além disso, é de salientar uma extraordinária intervenção de MFL. Como é do conhecimento dos leitores deste espaço, não somos dos que mais estão de acordo com as propostas de MFL, mas à que salientar, que teve um verdadeiro discurso de Estado, que foi muito elogiado. Só falta saber se este é o discurso oficial da liderança actual do PSD ou apenas um discurso de facção - os barões, como são conhecidos. (Bastou ver como a última fila, dita dos barões a aplaudiu de pé, e a maneira pouco efusiva do líder parlamentar). Este foi um discurso para fora do PSD, mas também, foi um discurso muito virado para dentro deste partido. Mas é bom que se saiba que, para além do déficit ou da dívida pública, o que está verdadeiramente em causa é o financiamento. Desde logo dos bancos que a criaram e daí o seu regozijo. (Veja-se a entrevista, ao Jornal de Negócios do patrão do BES, bem como, as revelações dos lucros das principais empresas, desde logo, as energéticas). É certo que tem havido mau direccionamento de alguns dos investimentos que foram efectuados, mas pensamos que as coisas já estão a ir longe de mais. Afinal, se ler-mos Eça de Queiroz, verificamos que afinal as coisas não mudaram tanto assim. Esse foi o drama da Monarquia, depois da República e, esperemos que, não o venha a ser de novo, desta Democracia que se apresenta tão doente. Contudo, e apesar de tudo, não devemos esquecer que esta crise mundial foi despoletada por um capitalismo feroz que tem no lucro desenferado e a qualquer preço, a sua divisa maior, aliada a uma ganância desmedida. A banca foi quem o despoletou e todos nós é que temos que pagar a factura. Não nos esqueçamos da romagem - ou intimidação - que um grupo dos nossos principais banqueiros fez a Passos Coelhos no sentido de o pressionar a criar condições para aprovar o orçamento. E ainda ontem, quando se iniciou o discussão do OE, Ricardo Salgado, o patrão do BES, em entrevista ao Jornal de Negócios dizia que "este acordo foi bom para nós, valeu bem a pena o nos termos esforçado para que ele fosse aprovado". Não temos nada contra os bancos - que achamos fundamentais para o financiamento da economia - nem contra os banqueiros, mas quem criou a crise devia assumir as responsabilidades. É injustificável para os portugueses que, enquanto todos se preparam para mais um ano muito difícil, a banca em geral vá apresentando cada vez mais lucros, como ainda ontem foi anunciado por algumas instituições bancárias enquanto, repetimos, se discutia o OE, que tantas restrições vai impor a todos nós. Mas a discussão ainda não terminou, agora vai-se seguir a discussão na especialidade e vamos ver o que lá vai acontecer. F. J. Quesado escreveu à uns anos atrás no jornal Público: "Vinte anos depois, Portugal é um país de auto-estradas com menos coesão territorial e crescentes desigualdades, numa Europa em grande indefinição de identidade". Isto depois de ter reflectido sobre o Quadro de Reestruturação Estratégica Nacional (QREN) cujas verbas poderiam ser canalizadas para outros fins que não aqueles para que foram criadas dadas as dificuldades financeiras do país. A impressão com que muitas vezes se fica, olhando para Portugal, nestes anos de tantos, tão dispersos e tão desperdiçados esforços, lembra a famosa história do barão de Munchaussen, que pretendia ter conseguido sair do pântano onde tinha caído, puxando... pelos próprios cabelos! Estamos num daqueles momentos em que, como há dias dizia Eduardo Lourenço, todos ganharíamos se a política deixasse cair a sua máscara de alegre comédia, e se assumisse como tragédia. Talvez essa mudança ajudasse a reinventar o sentido de responsabilidade, individual e colectiva, que a situação actual urgentemente reclama.

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