Equivocos da democracia portuguesa - 101
Vamos assistir nestas próximas duas semanas a uma campanha eleitoral onde vai valer tudo (infelizmente) em detrimento do esclarecimento das populações. Em boa verdade, também é certo que não à muito para esclarecer. É aplicar o programa da "troika", fingir que nele se altera isto ou aquilo, e nada mais. Nos próximos três anos, Portugal será governado por uma entidade estrangeira, (uma espécie de Filipes de Espanha), e quanto a isso não podem, nem devem, existir dúvidas. Contudo, há coisas - os detalhes - que não podem ser descurados e que são importantes para a nossa democracia. Como sejam, a educação, a saúde e o emprego. A educação porque um país não é verdadeiramente livre se não tiver conhecimento, e aqui, o PSD parece que tem outras ideias, bem perdidas no tempo, conduzindo-nos ao regime anterior. A ideia peregrina de criar condições de equidade entre o ensino público e privado mais não é do que criar situações de transfuga de fundos do ensino público para o privado. E isso é inadmissível, visto a maioria dos portugueses não disporem de meios para irem para o privado, conduzindo o público a uma situação residual, onde o insucesso escolar e a desmotivação dos professores serão palavras de ordem. Depois a saúde, onde a centralidade está no nosso SNS - conquista importante do 25 de Abril criado, é bom lembrar, por António Arnault quando foi ministro da saúde de Mário Soares - que parece que é intenção do PSD desmantelá-lo em detrimento da política privada de saúde. A última novidade do PSD soubesse no debate que Passos Coelho teve com Sócrates a semana passada, que é a questão dos co-pagamentos, isto é, os cidadãos para além de pagarem para o SNS através dos seus impostos, ainda terão que pagar pelos serviços que dele receberem. Isto sim, é gravoso e é preciso que os portugueses tenham em mente esta questão, por vezes diluída no calor duma campanha, como se de uma disputa futebolística se tratasse. Todos sabemos, - e já o afirmamos em anterior crónica -, que o SNS como os restantes apoios sociais, dentro daquilo que se chama "Estado Social" não poderão continuar como até aqui, simplesmente, porque o país não tem dinheiro para isso. Mas daí até destruírem tudo aquilo que de bom a democracia nos trouxe é demais. Quando Obama nos EUA tenta criar um serviço de saúde para todos, baseado naquilo que ele considera, e bem, como o modelo europeu, o PSD parece querer ir em sentido contrário, onde só aqueles que têm seguros de saúde é que podem ter acesso aos tratamentos médicos. Todos sabemos da vertente ultra-liberal de Passos Coelho, mas nunca imaginamos ver este partido a ir em sentido contrário à História e aos interesses da população que diz defender e a quem anda a pedir o voto. A questão do emprego é crucial, mas para isso, e apesar das dificuldades, o Estado deve continuar com o seu programa público - embora racionalizado -, porque só assim, terá condições para o criar. É uma ilusão pensar que só os privados criam emprego. Numa altura em que tanto se fala de Keynes, - e Passos Coelho deve conhecê-lo bem, afinal é economista -, parece não haver vontade política para ir nesse sentido, ou então, o compromisso com os privados é mais forte. Depois veio a polémica em torno das "Novas Oportunidades". Todos sabemos que há muito a corrigir, e que nem tudo são rosas neste processo, mas convenhamos que este programa foi um salto qualitativo para a qualificação dos portugueses e disso não tenhamos dúvidas. Qualquer um de nós, tem conhecimento de alguém que frequentou este programa, e da auto-estima que ele trouxe às pessoas, por isso, não se compreende o ataque suez que é feito a esta iniciativa. Até Marcelo Rebelo de Sousa - o insuspeitado comentador da área do PSD - achou de mais, qualificando a atitude de "erro do PSD". E vai mais longe, achando que se tratou dum "erro na substância" que encerra em si dois outros erros "um erro da generalização e considero, também, um erro dizer que não tem interesse por ser diferente do tradicional". Dando até o exemplo do que aconteceu com o seu pai - ex-ministro de Salazar - "quando se criou um programa de alfabetização que, embora não sendo a escola primária oficial, não deixava de ter interesse na qualificação dos portugueses e bons serviços prestou à nação". Aqui está a visão dum académico que, embora sendo do PSD, tem uma leitura mais abrangente do que é a qualificação académica que Passos Coelho parece não ter, ou não lhe interessa ter. Mas se o PSD foi lesto a criticar uma medida de qualificação dos portugueses, parece já não o ser, quando se trata da redução dos municípios e das freguesias - aliás, inscrito no programa da "troika". Passos Coelho apressou-se a afirmar aos seus autarcas que não seria assim, depois de algumas críticas que lhe foram feitos num dos comícios onde participou. Ele que tanto tem criticado os "boys" dos outros, não deixou de dar cobertura aos seus, sabendo da tradição municipalista do PSD. Afinal em que ficamos? Mais uma vez recorremos a Marcelo Rebelo de Sousa, "devia-se reduzir os municípios e as freguesias, e estas, até deveriam ser as primeiras. Esta será uma oportunidade de racionalizar o poder local". Mas Passos Coelho vai em sentido contrário, porque não quer perder votos. Afinal, ele que se apresenta ao país como o homem de "mãos limpas" que nunca governou, parece que está a aprender depressa a lição. Na política ninguém tem "mãos limpas" porque os interesses, mesmo que pontuais se sobrepõem a tudo o resto. E Passos Coelho não é diferente. Pensamos que seria diferente, - já aqui o dissemos por mais de uma vez -, mas confessamos a nossa desilusão, afinal, é mais um como os outros. E é com estas imagens degradantes que vamos dando para o exterior, que pedimos a ajuda dos outros, que devem estar, verdadeiramente, perplexos com "aqueles irredutíveis lusitanos" para usar uma expressão de Astérix. Isto será tanto mais incompreensível, quanto o de sabermos que quem nos vai emprestar dinheiro não será a Europa ou a América, mas sim, o Oriente, porque nenhum europeu vai querer ficar com a nossa dívida, e vai vendê-la, por sua vez, à China, Singapura e sabemos lá a quem mais, países em que os seus cidadãos poupam 30% a 40% do seu salário para ter assistência médica - se não bem morrem - e para terem algum no resto da vida - para não morrerem na indigência. Não é como no Ocidente. Lá não existe SNS. Afinal, parece ser aquilo a que Passos Coelho nos quer conduzir. E, já agora, esta simples questão: E porque será?
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