Boas Festas - Reflexões sobre o Natal
Decidi hoje trazer a lume esta mensagem, porque neste mesmo dia, celebrava o seu aniversário o meu avô materno José, um grande homem duma verticalidade ímpar. Ele é mais um dos que, emblematicamente, preenchem a minha já vasta galeria de ausentes. Daí a escolha e a antecipação da celebração natalícia e oportunidade para algumas reflexões. Com o frio que devagarinho se faz sentir, com Dezembro já profundo, com a época natalícia ao dobrar da esquina, é tempo propício para a reflexão, para a meditação. Neste dia em que a chuva escorre pela vidraça, inclemente mas leve, antecipando em dias o Inverno que aí vem, com o céu pintado de cinza querendo imitar o sentimento que envolve o meu coração, é tempo para olhar para trás e rever a vida, longe dos ruídos que nos perturbam e alienam. Nesta vida de encontros e desencontros, de entradas e saídas, de concordâncias e discordâncias, nesta inquietude que sinto dentro de mim, neste espírito inquieto que em mim transporto, vamos aproximando-nos do Natal. Época maior para as gentes, embora não a mais importante do calendário litúrgico. Neste ciclo sempre renovado que ano após ano faz a sua aparição, sinto sempre o mesmo, o vazio de quem já não tem os seus entes queridos, da dor das ausências, nesta inquietude que corrói. Longe vão os tempos da meninice, do aguardar da noite de Natal na expectativa dos brinquedos tão desejados, na ilusão proporcionada pelos meus saudosos avós. Adoro os seus preparativos, a sua chegada anunciada, mas quando ela se materializa a mente é invadida pelos habituais fantasmas. A solidão volta mesmo quando estou rodeado de gente - e esta é a pior das solidões - o sofrimento regressa nesta luta sempre adiada de reconciliação com o passado. Contudo, algo mudou desde há pouco mais dum ano. Reencontrei uma nova família - uma família de adoção - que me tem acolhido e rodeado do maior dos carinhos. E ganhei o mais importante, não o ouro, o incenso ou a mirra da história bíblica, mas uma adorável criança que tem povoado os meus dias, que tem povoado a minha mente com a maior das ternuras. Não se tratou do objeto material - e de preferência caro - ao qual perdemos o rasto passado algum tempo, não foi a roupa da moda - e já agora de marca - que fica "demodé" num ápice, (coisas habituais nesta quadra!), mas foi algo mais profundo, algo muito mais importante e perene, foi a Inês, a minha adorada afilhada, a mais bela flor do meu jardim de Outono como costumo dizer. Ela encerra em si todos os anseios, todas as expectativas, todas as crenças que projeto para o seu futuro radioso. Ela é a luz da minha vida, o indicador do rumo, o auxiliar na caminhada inexorável para o Inverno que a vida já me vai apontando, o alento para continuar. Sem o saber, sem percecionar o quanto deposito nela, a Inês vai seguindo os seus dias, cada vez mais bela, mais determinada, mais simpática, mais feliz. Ela é uma espécie de redenção de quem pensava que já não tinha direito a ela; de exorcismo de quem pensava estar possuído por uma dor férrea e interminável; de companhia de quem pensava que a solidão era o seu derradeiro desígnio. Expectativas elevadas, talvez, mas firmes na crença de que assumi um compromisso quando me tornei seu padrinho, compromisso esse que pretendo honrar, sem me desviar do rumo traçado. É com este espírito que vou caminhando em direção ao Natal. Com a certeza de ter já recebido o maior presente que poderia almejar, na convicção que esta criança será uma espécie de bálsamo que irá acalmar esta minha inquietude interna. Neste corpo que já começa a estar cansado, que vai percorrendo os espaços, esmagado por memórias pungentes, a Inês trouxe a alegria de um novo devir, de um outro renascer, qual Fénix. "Eu sou isto / mas sei que estás aqui" para utilizar as palavras sempre belas de Ruy Belo. É com este sentimento que me vou aproximando do Natal. (E não o daquela frase publicitária que anuncia o seguinte: "Reencontre o espírito de Natal na..." e a frase publicitária continua, indicando-nos a rede de lojas onde esse "espírito" se encontra e se vende). A todos queria aqui desejar um Feliz Natal e um próspero Ano Novo de 2013. A todos sem exceção. Áqueles de quem gosto e aos outros de quem gosto menos, ou mesmo, dos que não gostam de mim, independentemente do credo, ideologia ou raça. Aos meus ausentes, sempre presentes na minha memória e que vou venerando diariamente. À minha família de acolhimento que com a sua alegria me vai distraíndo dos pensamentos mais pesados mas, sobretudo, à minha querida Inês que encerra em si o que de melhor tenho neste e em futuros Natais, bem como, o seu irmão Tiago, uma criança verdadeiramente adorável, e ambos em conjunto, enchem uma casa de alegria e inocência. Nunca esquecendo os Animais nossos irmãos que sofrem em silêncio a ignomínia humana e que serão sacrificados, também nesta data e em nome dela, que se quer de paz, e a Natureza tão essencial à vida e, simultaneamente, tão desprezada e vilipendiada. E a todos aqueles que se assumem como religiosos, só quero lembrar esta passagem do Génesis: "Ainda que seja o dono da criação, o homem não deve destruí-la. Ele precisa admirá-la, explorá-la e conhecê-la" (2,20). A todos quero envolver num abraço fraterno, num abraço de paz que deve repetir-se ao longo do ano e não só nesta quadra. Como dizia o poeta: "Natal é quando um homem quiser". E que bom seria que o quisesse todos os dias de todos os anos. Boas Festas para todos.
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