Turma Formadores Certform 66

Friday, March 14, 2014

Equivocos da democracia portuguesa - 327

Na passada quarta-feira o país foi surpreendido por um documento onde se apela à reflexão sobre a reestruturação da dívida portuguesa, o texto que passou a ser conhecido por "Manifesto dos 70". Assinado por mais de 70 personalidades de diferentes credos e posicionamentos políticos, que vão da esquerda à direita, buscou-se um alargado consenso de opiniões e ideias sobre este assunto. Nem os parceiros sociais ficaram de fora, quer sejam representantes dos trabalhadores ou dos patrões. Gostemos ou não, queiramos ou não, este é um documento fundamental que tardou em aparecer e que agora viu a luz do dia e com estrondo. Os comentários e polémicas que desde logo provocou são o maior sintoma da sua relevância nos dias que correm. Os apaniguados do governo logo cerraram fileiras, os comentadores, mais ou menos "iluminados" que tantas laudas têm dado à governação ultraliberal de Portugal, tiveram que vir a terreiro descredibilizando o documento à falta de argumento melhor. Mas o mais curioso é que este documento foi também subscrito por dois conselheiros de Cavaco Silva, que logo foram dispensados - "a seu pedido" como é normal nestas coisas - o que dá a ideia de que quem não está com Cavaco é automaticamente arredado. E aqui é que nos fica uma pergunta que julgamos oportuna quanto incómoda. Afinal que democracia é esta em que se é despedido por delito de opinião? E logo vindo do mais alto representante do país não deixa de ser curioso e incomodativo. Curioso porque parece que Cavaco continua a achar que o mundo gira em seu torno, afinal ele é o homem "que nunca se engana e raramente tem dúvidas". Incomodativo porque parece que esta democracia é cada vez mais formal e menos real. Já aqui, e por diversas vezes, chamamos a atenção para este facto. O viver em democracia não é apenas ir votar de quatro em quatro anos, é muito mais do que isso. Se o governo não deixa de mostrar os seus laivos de afrontamento a todo um país, que lá vai conseguindo impor as suas ideias, distorcendo a democracia que as pessoas continuam a pensar que é o regime em que vivem. Agora, o Presidente da República mostra claramente que, afinal, tal como antes do 25 de Abril de 1974, se pode despedir por delito de opinião. Isto deve-nos fazer pensar na qualidade da democracia que temos e na que queremos ter. Desde há muito que se sente uma certa instituição do medo, que foi colocada sobre os portugueses, e quando algumas pessoas o afrontam, são logo chamadas de masoquistas ou de outras coisas piores. A poucas semanas de se celebrar o 40º aniversário do 25 de Abril pensamos que esta pode ser bem a altura para esta reflexão. Antes que seja demasiado tarde.

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