Turma Formadores Certform 66

Wednesday, August 26, 2009

Equivocos da democracia portuguesa - 4


Assistimos hoje a mais um dos casos recambulescos da nossa democracia. Passados 35 anos sobre o 25 de Abril de 1974 que nos devolveu a democracia, passados 35 após a libertação dos presos políticos em Portugal, após 35 anos do fim das guerras coloniais, assistimos hoje ao impensável. Mais uma vez o espaço foi o da SIC Notícias, o convidado de Mário Crespo era Fernando Negrão. Este dirigente do PSD, que já foi ministro do trabalho e da segurança social, e já liderou a Polícia Judiciária, foi protagonista dum dos maiores insultos à democracia portuguesa. A propósito dos incidentes no Seixal, veio afirmar que falta às polícias portuguesas um orgão supervisor que faça a triagem dos vários casos, dando como exemplo, o da PIDE/DGS, ex-polícia política do anterior regime, com um dos bons exemplos a seguir. Mário Crespo lá foi dizendo que não seria bom pensar nisso com essa vertente, mas o que foi dito estava dito, e isso só vem tornar claro aquilo que algumas pessoas, que vão vivendo à custa da nossa democracia, pensam. É certo que se tem assistido a um eclodir de conflitos sociais, a polícia é desrespeitada a todo o momento, mas as questões são mais fundas do que aquilo que se pensa. Estes conflitos estavam iminentes há muito tempo, e só quem não está atento à realidade não dá por eles. O forte desemprego que existe é um factor determinante, bem como, a não inclusão social daqueles que vieram para Portugal. Desde logo, a comunidade africana que chegou depois de Abril de 74, depois as outras comunidades que foram tomando o rumo do nosso país. Veja-se o que está a acontecer em França com a comunidade magrebina. Quem conhece França, à muito que tinha a consciência de que isto ia acontecer, para isso bastava circular no metro e ver o que lá se escrevia. Que seja do nosso conhecimento, nunca ninguém achou por bem dizer que o importante era ter uma estrutura organizacional semelhante às SS nazis, que tão "bons serviços" prestaram durante a ocupação. E o que não se deveria dizer daquilo que foi o Maio de 68, que muitos se lembram, e Fernando Negrão seguramente que sabe do que estamos a falar. Porque não estar atentos aos estudos sociológicos de António Barreto que tanto tem indicado o caminho a seguir, sem que ninguém lhe dê ouvidos? Este é mais um equívoco da nossa democracia, ou pelo menos, de alguns dos seus agentes. Pensamos que Portugal merecia melhor. Porque não reflectimos sobre os erros cometidos com a integração das minorias, porque os encerramos em "ghettos", porque não promovemos a sua integração de facto. Veja-se o exemplo inglês com a integração da comunidade indiana. Quem por lá já passou, sabe que isto é um facto, como as comunidades se foram diluindo na urbe, e não marginalizadas em bairros construídos para o efeito. Ninguém gosta de se sentir excluído, e muitos portugueses sabem-no bem, nomeadamente, aqueles que foram no início dos anos 60 para França para viver nos tristemente célebres "bidonvilles". Hoje estão integrados, porque o país criou condições para isso, alguns até são líderes autárquicos. Este foi o caminho que não fomos capazes de trilhar, e refiro-me ao poder político, que é pago por todos nós, que nos sentimos insultados por afirmações levianias como aquela que foi proferida por Fernando Negrão, ele também um político. Mas mais do que afirmações, o mais grave, é que talvez traduzam um pensamento político, lá no fundo, bem escondido. Preferimos as afirmações directas, claras e, por vezes, irresponsáveis de Alberto João, que pelos visto tem muitos seguidores ideológicos no seu partido, e podem crer, que Alberto João sabe bem do que fala, porque conheceu bem os meadros do regime fascista. Todos os totalitarismos começam assim. Salazar invocou o caos da República, os republicanos, o caos da monarquia. E assim por diante. É bom que tenhamos memória, para não cairmos nos facilitismos da geração dos nossos pais e avós que colocaram uma ditadura a gerir Portugal em nome da "segurança e da estabilidade".

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