Equivocos da democracia portuguesa - 77
Ontem, tomou posse o Prof. Cavaco Silva, para um segundo mandato para PR. Assistimos a algo impensável na história da nossa democracia. Cavaco profere um discurso inapropirado, sectário e divisionista. Inapropriado, porque numa tomada de posse deve-se procurar consensos e não divisões, afinal ele foi eleito pelos votos de portugueses das mais variadas opiniões políticas, mesmo de gente afecta ao governo. Sectário, porque virado para a direita, não abrangendo o país como se esperava, essencialmente alinhado pelo seu partido. Divisionista, porque dividiu o país em dois, - e mesmo na AR, bastou ver que só o PSD e o CDS/PP aplaudiram o discurso -, porque nele viram a instabilidade que se avizinha, o que quer dizer, a possibilidade de chegarem ao governo mais cedo do que esperavam. Contudo, não deixa de ser estranho este discurso nesta altura. Cavaco até tem alguma razão sobre algumas questões mas porque não disse nada à mais tempo? Afinal este discurso tinha lugar à dois, três, quatro anos atrás, mas não foi feito porque havia a possibilidade de afectar os votos que por aí vinham. Cavaco afinal, com o seu silêncio de então, - os "tabús", como lhe chama -, acabou por ser conivente com tudo o que se está a passar, mas o oportunismo que é apanágio dos políticos - também de Cavaco, embora este o negue - fez com que só agora resolvesse falar mais claramente. Cavaco mostra que não esqueceu o que se passou na campanha eleitoral, bem como, algumas questões em que teve de ceder face ao governo. O lado vingativo de Cavaco - sobejamente conhecido - veio ao de cima duma forma, no mínimo, deselegante. Ouvimos falar, no anterior mandato, em "cooperação estratégica", - seja lá o que isso for -, coisa que nunca se soube bem o que era, talvez só tenha existido na cabeça do PR; agora ouvimos falar em "magistratura activa", o que quer dizer que Cavaco tudo fará para derrubar o governo - embora não o assuma - para colocar o seu partido no poder. Daí o entusiasmo com que o PSD aplaudiu o PR. Não se auguram tempo bons para a nossa democracia, não bastavam as dificuldades económicas e financeiras porque estamos a passar, para nos virmos confrontados com uma instabilidade política que em nada vai ajudar este país. Afinal já o tínhamos previsto aqui, a quando da campanha eleitoral. A profecia parece que se cumpriu. Veremos até quando... Mas o mais curioso é que não ouvimos nenhuma solução para os problemas que nos afligem. Depois duma tentativa de aula de economia e finanças, ficou por indicar as terapias a seguir, só por isso, soube a pouco. No final da cerimónia muitos falaram, e bem, sobre o diagnóstico feito, mas o que faltou foi dizer que medicação deveria ser prescrita a este doente chamado Portugal. Criticar é fácil, e Cavaco sabe-o bem, até porque foi PM durante dez anos, mas arranjar e implementar soluções é mais difícil. Não nos pareceu que Portugal tenha beneficiado alguma coisa com esta intervenção, sobretudo num momento em que precisa do apoio externo. Esta clivagem assumida publicamente pelo PR face ao governo em nada vem ajudar a já de si difícil situação do país. Há coisas que, em política, não podem ser ditas publicamente, e Cavaco sabe-o bem. Daí o discurso que fez ter o sabor de criar condições de ingovernabilidade e preparar o terreno para que o seu próprio partido chegue ao poder. Foi claro que, alguns dos dirigentes do PSD e do CDS/PP assim o interpretaram, e com certeza o país não deixou de tirar as suas ilações. Veremos como as coisas vão evoluir daqui para a frente, mas a estabilidade prometida por Cavaco, parece que só existe nas palavras, o que não deixa de ser uma deslealdade para quem o elegeu no pressuposto de buscar essa estabilidade política em momento tão difícil. Veremos se esta entrada de "leão" não prefigurará um PR "à rasca"!!! Estejamos atentos aos sinais. À noite numa entrevista, o Prof. Adriano Moreira, - um verdadeiro Senador da nossa República, e personalidade acima de quaisquer suspeitas -, dizia sabiamente: "Depois de ter ouvido este discurso, cheguei à conclusão que a campanha eleitoral ainda não acabou, o que é mau para Portugal". Mas o mais curioso, é que hoje os principais jornais "on-line", abriam com destaque para as mais variadas notícias, remetendo o discurso de Cavaco para um segundo plano. Até o especializado jornal "Económico" abria com as principais fortunas portuguesas, e o discurso do PR aparecia numa terceira linha, quase em rodapé. Será que isto quer dizer alguma coisa?
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